TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

133 acórdão n.º 398/11 pertencia ao progenitor que tivesse a guarda do filho, presumindo-se que era a mãe que tinha essa guarda. O outro progenitor podia apenas vigiar a educação e as condições de vida do filho (artigo 1906.º, n.º 4, do Código Civil). Esta solução, de raiz eminentemente realista, procurou nestas situações conferir certeza e eficácia à representação dos interesses do menor que exigem nos primeiros anos de vida a tomada de decisões de par- ticular importância, atribuindo, em exclusivo, o poder paternal a quem de facto tem a guarda do menor, presumindo, em atenção aos dados estatísticos, que essa pessoa era a mãe. Esta presunção, no caso de não corresponder à realidade, só podia ser ilidida em acção judicial (vide, sobre este regime, José Carlos Moitinho de Almeida, em Efeitos da filiação , em Reforma do Código Civil , pp. 161-162, edição de 1981, da Ordem dos Advogados, Pires de Lima/Antunes Varela, em Código Civil anotado , vol. V, pp. 412-413, da edição de 1995, da Coimbra Editora, Pereira Coelho/Guilherme de Oliveira, em Curso de direito de família , vol. I, p. 130, da edição de 2008, da Coimbra Editora, e Carlos Olavo, em Sobre a aplicação do processo de regulação do exercício do poder paternal aos filhos dos pais não unidos pelo matrimónio e que não hajam convivido maritalmente , na Colectânea de Jurisprudência, Ano XI, tomo 1, pp. 21-22). Com as alterações introduzidas pela Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, na mesma situação, o regime regra passou a ser o exercício em comum das responsabilidades parentais por ambos os progenitores, rela- tivamente às questões de particular importância para a vida do filho, salvo se decisão judicial fundamenta- da estabelecer que essas responsabilidades sejam exercidas por apenas um dos progenitores (artigo 1906.º, n. os 1 e 2, do Código Civil). Conforme resulta da leitura do Preâmbulo do Projecto de Lei n.º 509/X, a imposição do exercício con- junto das responsabilidades parentais, visou combater o afastamento dos pais homens e a fragilização da sua relação afectiva com os filhos, promovendo a igualdade do género e garantindo a concretização do direito das crianças à manutenção de laços afectivos com ambos os pais (vide sobre o novo regime, Guilherme de Oliveira, em “Linhas gerais da reforma do divórcio”, em Lex Familiae , Ano 5.º (2008), n.º 10, pp. 63 e segs., Maria Clara Sottomayor, em “Exercício conjunto das responsabilidades parentais: igualdade ou retorno ao patriarcado?’, em E foram felizes para sempre…? Uma análise crítica ao novo regime jurídico do divórcio , pp. 113 e segs., da edição de 2010, da WoltersKluver/Coimbra Editora, Hugo Leite Rodrigues, em Questões de particular importância no exercício das responsabilidades parentais , pp. 85 e segs., da edição de 2011, da Coimbra Editora, Rita Lobo Xavier, em Recentes alterações ao regime jurídico do divórcio e das responsabilidades parentais: Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro , pp. 69-70, da edição de 2009, da Almedina, Tomé D´Almeida Ramião, em O divórcio e questões conexas , pp. 139-140, da edição de 2009, da Quid iuris , Helena Gomes de Melo e outros, em Poder paternal e responsabilidades parentais , pp. 23 e segs. da edição de 2009, da Quid iuris , Helena Bolieiro/Paulo Guerra, em A criança e a família…Uma questão de Direito(s): visão prática dos princi- pais institutos do direito da família e das crianças e jovens , pp. 29-31, da edição de 2009, da Coimbra Editora). A Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, que entrou em vigor a 30 de Novembro do mesmo ano, inclui uma norma que regula especificamente a sua aplicação no tempo, determinando que a mesma não se aplica aos processos pendentes (artigo 9.º), o que abrange as acções de regulação do exercício das responsabilidades parentais já propostas, como sucede com o presente processo. A sentença recorrida recusou a aplicação desta norma por entender que a mesma violava o princípio constitucional da igualdade, ao “introduzir um tratamento discriminatório, desigual e injustificado dos proge- nitores em função da simples propositura da acção e conduz ao absurdo do conteúdo dos poderes-deveres dos progenitores poder divergir tão só por causa daquele critério temporal”. É necessário começar por dizer que a mera sucessão de leis no tempo, em matéria de direitos familiares, não afecta, só por si, o princípio da igualdade. Apesar de uma alteração legislativa poder operar uma modificação do tratamento normativo em rela- ção a uma mesma categoria de situações, implicando que realidades substancialmente iguais passem a ter soluções diferentes, isso não significa que essa divergência seja incompatível com a Constituição, visto que ela é determinada, à partida, por razões de política legislativa que justificam a definição de um novo regime

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