TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
131 acórdão n.º 398/11 do a referência ao “poder paternal” a considerar-se substituída pela designação “responsabilidades parentais” nas epígrafesda secção II e da sua subsecção IV, do capítulo II, do título III, do livro IV do Código Civil e em todas as disposições da secção II, do capítulo II, do título III, do livro IV do Código Civil. (…) No entanto, mais importante do que esta redenominação, é a alteração introduzida no leque dos poderes- -deveres dos progenitores não unidos pelo casamento e que não vivem em condições análogas às dos cônjuges, prevendo-se na Lei n.º 61/2008, como regime regra, o exercício em comum das responsabilidade parentais por am- bos os progenitores relativamente às questões de particular importância, exercício em comum que só é passível de ser afastado por decisão judicial fundamentada (artigos 1906.º, n. os 1 e 2 e 1912.º, n.º 1, ambos do Código Civil). No regime anterior, no caso de progenitores não unidos entre si pelo casamento e que não vivessem em união de facto, ou havia acordo dos progenitores no sentido do exercício em comum por ambos ou, não existindo tal acordo, o exercício do poder paternal competiria ao progenitor que tivesse a guarda do menor, presumindo-se iuris tantum que tal guarda cabia à mãe do menor. Ao progenitor a quem não competia o exercício do poder paternal assistia o poder de vigiar a educação e as condições de vida do filho (artigo 1906.º, n.º 4, do Código Civil, na redacção anterior à introduzida pela Lei n.º 61/2008). Apesar desta verdadeira revolução copernicana, no que tange o regime do exercício das ora denominadas res- ponsabilidades parentais, ou talvez por isso, o legislador previu no artigo 9.º da Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, que tal regime não se aplica aos processos pendentes em tribunal. (…) A questão que a referida norma transitória coloca é a de saber se é sustentável, do ponto de vista do princípio constitucional da igualdade, que o conteúdo dos poderes-deveres dos progenitores relativamente a seus filhos possa depender duma circunstância tão aleatória como é a propositura de uma acção. A mesma norma suscita também a questão de saber quais os poderes-deveres dos progenitores que viram a sua situação resolvida antes da entrada em vigor da Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro. Será que continuarão a ter os mesmos poderes-deveres, não lhes sendo aplicável o novo regime e nem podendo tal alteração legislativa, por si só, fundamentar uma alteração da regulação do exercício do poder paternal (neste sentido que decididamente repu- diamos veja-se, Tomé d’Almeida Ramião, O Divórcio e Questões Conexas, in QuidJuris 2009, p. 164); ou, ao invés, em homenagem ao princípio constitucional da igualdade que impõe que situações iguais devam ser igualmente tratadas, bem como considerando as regras gerais sobre aplicação no tempo de normas relativas ao conteúdo de uma relação jurídica, abstraindo dos factos que lhe deram origem (artigo 12.º, n.º 2, 2.ª parte do Código Civil), deve o novo regime aplicar-se aos processos pendentes. (…) A nosso ver, a norma transitória em análise introduz um tratamento discriminatório, desigual e injustificado dos progenitores em função da simples propositura da acção e conduz ao absurdo do conteúdo dos poderes-deveres dos progenitores poder divergir tão só por causa daquele critério temporal. Pode até suceder que o mesmo progeni- tor tenha poderes-deveres distintos relativamente a filhos diferentes e de mães diversas, apenas porque os processos nos quais vieram a ser regulados o exercício do poder paternal/responsabilidades parentais foram instaurados em momentos diversos. Em nosso entender, tal disposição transitória, com tal alcance, atenta contra o princípio da igualdade (artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa), na medida em que progenitores colocados na mesma situação de facto terão poderes-deveres diversos no que respeita as ora denominadas responsabilidades parentais, tão-só por causa do momento em que foi proposta a acção para tal regulação. Afigura-se-nos deste modo que aquela norma transitória enferma de inconstitucionalidade material e deve por isso ser desaplicada (artigos 13.º, 204.º e 277.º, n.º 1, todos da Constituição da República Portuguesa). Assim, desaplicando-se pelos referidos fundamentos o artigo 9.º da Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, aplicar-se-á ao caso dos autos a nova lei. (…).»
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