TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011
120 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E o simples facto do legislador nacional entender, com justificação ou sem ela, que determinadas fina lidades da sua política económica só poderão ser plenamente atingidas se determinadas medidas forem adoptadas em todo o território nacional, não lhe permite retirar às Regiões Autónomas, mesmo a título transitório, a autonomia legislativa que a Constituição lhes confere nos artigos 227.º e 228.º Conforme se afirmou no recente Acórdão n.º 304/10, deste Tribunal, após a última revisão constitu- cional a reserva de determinado tema ao legislador nacional só poderá resultar da sua inclusão no elenco das matérias tipificadas nos artigos 164.º e 165.º da Constituição, por virtude dessa reserva resultar de outras disposições específicas do texto constitucional, por o seu conteúdo extravasar o âmbito regional ou por ele não integrar a lista dos assuntos que os Estatutos político-administrativos da região consideram estar incluí- dos na sua competência legislativa. Não se verificando, no presente caso, nenhuma destas situações, não podia o legislador nacional deter- minar que as medidas por si aprovadas de redução das retribuições pagas aos gestores públicos, ou equipara- dos, aos trabalhadores e aos membros dos órgãos e das entidades que integram o sector empresarial regional, aos trabalhadores das administrações regionais, e dos valores pagos por contratos de aquisição de serviços que venham a celebrar-se ou a renovar-se em 2011, outorgados por entidades do sector empresarial regional, prevaleciam sobre quaisquer normas emitidas nestas matérias pelo legislador regional, pelo que me pronun- ciei pela inconstitucionalidade desse segmento do artigo 19.º, n.º 11, do Orçamento do Estado para 2011, aprovado pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro. – João Cura Mariano . DECLARAÇÃO DE VOTO Estou em total desacordo com a presente decisão e os seus fundamentos, pelos seguintes motivos: A Constituição não atribui uma competência genérica ao requerente – o Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira – para solicitar ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade, ou de ilegalidade, com força obrigatória geral, de normas. Com efeito, o artigo 281.º, n.º 2, alínea g), da CRP apenas lhe permite requerer “quando o pedido de declaração de inconstitucionali- dade se fundar em violação dos direitos das regiões autónomas ou o de declaração de ilegalidade se fundar em violação do respectivo estatuto”. Seria, a meu ver, necessário começar por confrontar o pedido agora em análise com esta norma constitucional para definir com rigor o âmbito das questões de que cumpriria tratar. É que, no que toca à inconstitucionalidade, o vício só é relevante no caso de as normas impugnadas se tra- duzirem na violação dos direitos constitucionalmente atribuídos às regiões autónomas; e, no que concerne à ilegalidade, o Tribunal apenas pode averiguar a conformidade das normas impugnadas com um único parâmetro: a violação do respectivo Estatuto. Acontece que o Acórdão não coteja o pedido com esta imposição constitucional. O Acórdão fundamenta-se, no que toca à questão das reduções remuneratórias previstas no artigo 19.º da Lei do OE quanto aos “deputados às Assembleias Legislativas das regiões autónomas” e aos “membros dos governos regionais”, no decidido no Acórdão n.º 251/11, o que naturalmente conclama a declaração de voto que aduzi a esse aresto. Na verdade, a reserva constitucional de estatuto proíbe, em absoluto, que outro “tipo” de actos normativos regule a matéria incluída nessa reserva (cfr. artigos 112.º, n.º 3, 168.º, n.º 6, alínea f ), e 226.º da Constituição). A norma em causa, ao pretender declaradamente interferir no montante das remunerações auferidas pelos titulares de órgãos de governo próprio das regiões autónomas, visou disciplinar o estatuto remuneratório desses agentes, definindo desse modo o estatuto dos titulares de órgãos de governo próprio das regiões autónomas, em manifesta violação do disposto no aludido n.º 7 do artigo 231.º da Constituição, que afirma expressamente: O estatuto dos titulares dos órgãos de governo pró- prio das regiões autónomas é definido nos respectivos estatutos político-administrativos.
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