TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

107 acórdão n.º 613/11 das taxas de juros, depende da confiança que estes depositam na capacidade dos Estados e das entidades públicas com ele financeiramente relacionadas pagarem pontualmente as suas dívidas no momento do seu vencimento. Ora tal confiança assenta, desde logo, na credibilidade financeira que os Estados demonstram não apenas indirectamente por via da competitividade das suas economias, mas também, directamente, por via da redução do seu défice público. É neste quadro que aparecem justificadas as reduções remuneratórias previstas no OE para 2011. Diz-se, de facto, no Relatório do Orçamento do Estado para 2011 (p. 45): «Uma medida como a da redução remuneratória só é adoptada quando estão em causa condições excepcionais e extremamente adversas para a manutenção e sustentabilidade do Estado Social. […] Com efeito, importa […] considerar a indispensável sustentabilidade das contas públicas e o inerente interesse público da mesma, que […] é um interesse constitucionalmente protegido, sobretudo, e de forma decisiva, numa conjuntura em que o reequilíbrio das contas públicas se afigura essencial para a confiança dos mercados financeiros internacionais no esforço de consolidação orçamental que está a ser desenvolvido pelo Governo, com as consequen- tes repercussões sobre os juros, o custo da dívida pública e a capacidade de financiamento da economia nacional.» Trata-se, nestas medidas de redução remuneratória, de uma forma, prevista em conjunto articulado com diversas outras (explicitadas no Relatório do Orçamento do Estado para 2011, esp., p. 41), de reduzir a despesa pública, e consequentemente o défice orçamental, operando simultaneamente uma contenção do aumento da dívida pública. Utilizando as palavras do Acórdão n.º 567/04, podemos dizer que as medidas de redução remuneratória se contam no quadro de um conjunto mais vasto de medidas de redução da despesa e do défice públicos que visam fazer face à existência de “sérios riscos com projecção na economia e nas finanças do todo nacional, como ser[á] o caso de aumento das taxas de juro do mercado ou de elevada repercussão nos compromissos internacionais assumidos pelo Estado no sentido de diminuir os défices orçamentais e o peso da dívida pública face ao PIB”. Acontece que a sustentabilidade das contas públicas, com a correspondente redução do défice e o con- trolo da dívida, é algo que, no entender justificável do legislador parlamentar, só poderá ser eficazmente garantido se for feito, não apenas ao nível do Estado, mas também, articuladamente, ao nível das entidades públicas que estão, de uma forma ou de outra, financeiramente relacionadas com esse mesmo Estado. É algo que só pode ser eficazmente levado a cabo num quadro de “unidade nacional” e de “solidariedade entre todos os portugueses” e através de medidas universalmente assumidas enquanto actos de “soberania do Estado” legitimados pela sua própria subsistência financeira bem como da de toda a economia nacional (cfr. artigo 225.º, n. os 2 e 3, da Constituição). Deste modo, será de considerar constitucionalmente legítimo que o poder legislativo soberano do Estado assuma que as medidas exigidas por uma urgente consolidação das contas públicas não devam ser tomadas isolada e descontextualizadamente apenas em partes do território nacional ou valendo apenas para parte dos cidadãos. Poderia porventura dizer-se que uma tal posição restauraria, pelo menos em parte, a ideia de “leis gerais da república” que foi propositadamente eliminada do texto constitucional em 2004. Mas a verdade é que, não obstante o desaparecimento das leis gerais da república como categoria geral, não é sustentável − à luz dos fundamentos, finalidades e limites da autonomia regional enunciados nomeadamente no artigo 225.º da actual Constituição − a ideia de que nunca, e em circunstância alguma, possa haver medidas legislativas que muito embora não estejam textualmente no domínio da reserva de competência da Assembleia da República sejam, por motivos de relevante interesse nacional, tomadas imperativamente para todo o território nacional. É nesta linha que o Tribunal tem admitido a existência de matérias que por sua natureza devem ficar reservadas aos órgãos de soberania, isto é, que constituem uma reserva de competência legislativa do Estado ou, se se preferir, da República. Como ainda actualmente afirmam Gomes Canotilho e Vital Moreira, Cons- tituição da República Portuguesa Anotada , vol. II, Coimbra 2010, p. 661:

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