TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 82.º Volume \ 2011

106 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL efeito, a alínea qq) do artigo 40.º do EPARAM, que o Requerente invoca, refere-se apenas à “organização da administração regional e dos serviços nela inseridos”. Ora o que está aí em causa é a estrutura organizativa da administração regional em diferentes entidades e serviços. Não são, como sucede nas normas agora impug- nadas, as remunerações das pessoas que trabalhem ou exerçam funções na administração pública regional, incluindo o sector empresarial regional [alíneas q), r) e t) do n.º 9 do referido artigo 19.º]. Na melhor das hipóteses, seria aqui invocável a já referida cláusula geral da alínea vv) do artigo 40.º do EPARAM. Seja como for, nunca alguma dessas menções estatutárias seria de molde a impedir a Assembleia da República de legislar sobre a matéria e, mais ainda, de o fazer com a força imperativa que conferiu aos pre- ceitos que aprovou, tudo isto nos termos da sua competência legislativa genérica que “é conatural à própria natureza e sentido histórico da assembleia representativa” (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , 4.ª edição, vol. II, Coimbra 2010, p. 290). É verdade que a ideia de que “de acordo com os princípios democrático-representativos convencionais, a ela [à Assembleia da República] devia caber em princípio toda a competência legislativa e nenhum domínio lhe estaria vedado” sofre um desvio pelo facto de as Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas goza- rem concorrencialmente de poderes legislativos no seu domínio próprio de actuação, nos termos dos artigos 227.º, n.º 1, e 228.º da Constituição (ver, novamente, Gomes Canotilho e Vital Moreira, loc. cit. ). Deve, no entanto, deixar-se claro que os órgãos de soberania podem legislar para todo o território nacional, incluindo as regiões autónomas. E deve, além disso, dizer-se que a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem excluído que o conceito de “âmbito regional” tenha uma componente meramente “ terri- torial ”, devendo atender-se aos fundamentos, aos fins e aos limites que a Constituição assinala à autonomia regional, no seu artigo 225.º É em especial o que se retira do Acórdão n.º 258/07: « (…) Este “âmbito regional”, tendo necessariamente uma componente territorial, inerente à natureza de “pes- soas colectivas territoriais” que o corpo do n.º 1 do artigo 227.º da CRP associa às regiões autónomas (cfr. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional , Tomo V – Actividade Constitucional do Estado , 3.ª edição, cit., p. 401), não se esgota, porém, nessa componente. Há, na verdade, que atender aos fundamentos, aos fins e aos limites que a Constituição assinala à autonomia regional, no seu artigo 225.º: os fundamentos dessa autonomia assentam nas características geográficas, económicas, sociais e culturais dos arquipélagos dos Açores e da Madeira e nas históricas aspirações autonomistas das populações insulares; os fins consistem na participação democrática dos cidadãos, no desenvolvimento económico-social, na promoção e defesa dos interesses regionais, mas também no reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses; os limites derivam da não afectação da integridade da soberania do Estado e do respeito do quadro constitucional. Assim, a circunstância de a legislação regional se destinar a ser aplicada no território da Região não basta, só por si, para dar por verificado o apontado requisito. O modelo constitucional de repartição da competência legislativa continua a não assentar numa “divisão territorial do poder legislativo, com transferência de matérias do centro para a periferia” (Maria Benedita Urbano, Poder legislativo regional …, cit. , p. 77). Nesse “âmbito regional” não podem deixar de relevar considerações sobre a matéria sobre que versa essa normação, atenta a justificação material do regime autonómico constante do artigo 225.º O território da Região é também (ou em primeira linha) território do Estado, nele vigorando simultaneamente a ordem jurídica estadual e a ordem jurídica regional, só se podendo considerar como integrando o âmbito desta (o “âmbito regional”) a regulação de situações que não afectem, atentas as pessoas (designadamente, pessoas colectivas públicas) envolvidas e os interesses e valores em jogo, a ordem jurídica nacional. (…)» No caso, estamos perante uma medida legislativa que almeja dar uma resposta institucionalmente abrangente a um problema de emergência orçamental e financeira de amplitude nacional e que no entender do legislador parlamentar − enquanto órgão democrático representativo do Estado unitário − só é susceptí- vel de ser combatido com base em medidas de âmbito nacional. Posição esta perfeitamente compreensível, porquanto o comportamento dos mercados financeiros, no que respeita à concessão de crédito e à fixação

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