TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

81 acórdão n.º 18/11 a) a afectação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível, quando constitua uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dela constantes não possam contar; e ainda; b) quando não for ditada pela necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalecentes (deve recorrer-se, aqui, ao princípio da propor- cionalidade, explicitamente consagrado, a propósito dos direitos, liberdades e garantias, no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição). Os dois critérios enunciados são, no fundo, reconduzíveis a quatro diferentes requisitos ou “testes”. Para que haja lugar à tutela jurídico-constitucional da «confiança» é necessário, em primeiro lugar, que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados «expectati- vas» de continuidade; depois, devem tais expectativas ser legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspectiva de continuidade do «comportamento» estadual; por último, é ainda necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa (neste sentido, o Acórdão n.º 128/09). Este princípio postula, pois, uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na estabilidade da ordem jurídica e na constância da actuação do Estado. Não há, no entanto, como igualmente se afirmou, «um direito à não-frustração de expectativas jurídicas ou a manutenção do regime legal em relações jurídicas duradoiras ou relativamente a factos complexos já parcialmente realizados». Ou seja, o legislador não está impedido de alterar o sistema legal afectando relações jurídicas já constituídas e que ainda subsistam no momento em que é emitida a nova regulamentação, sendo essa uma necessária decorrência da autorevisibilidade das leis. O que se impõe determinar é se poderá haver por parte dos sujeitos de direito um investimento de confiança na manutenção do regime legal. Quanto a este aspecto da questão, a decisão recorrida, por remissão para o parecer do Ministério Públi- co, limita-se a considerar que a norma sindicada violou as legítimas expectativas do impugnante, porquanto o agravamento da taxa de tributação ocorreu já próximo do termo do ano fiscal, quando o interessado «não só já havia efectuado as suas opções em termos de despesas e encargos em causa, mas também já nada poderia fazer para alterar as opções tomadas». Atentando, porém, nos pressupostos ou requisitos da protecção de confiança que se deixaram já enun- ciados, não pode afirmar-se, desde logo, que, no caso, tenha o Estado encetado comportamentos capazes de gerar nos privados «expectativas» de continuidade da taxa de tributação mais favorável que vinha sendo aplicada. Não existia nenhuma indicação segura que permitisse concluir que o legislador haveria de abster- -se de alterar o regime legal de tributação autónoma, e, pelo contrário, a alteração do regime legal, com base em razões de interesse público, seria sempre uma possibilidade com que os contribuintes poderiam contar; e, por outro lado, não é o simples facto de a alteração legislativa produzir um agravamento da posição fiscal do contribuinte que permite considerar que essa alteração deva sempre ocorrer no início de cada ano fiscal, e não já no seu decurso. Ou seja, não existe uma expectativa constitucionalmente tutelada no sentido de considerar que qualquer agravamento fiscal é apenas aplicável a factos tributários futuros. De outro modo, por efeito da ponderação do princípio da protecção da confiança, tornar-se-ia inoperante o entendimento formulado pelo Tribunal Constitucional quanto ao âmbito da proibição constitucional da retroactividade, implicando que sempre que ocorresse uma situação de retrospectividade ou retroactividade inautêntica haveria de julgar-se verificada a inconstitucionalidade. 4. Por outro lado, não parece sequer que o impugnante pudesse invocar ter efectuado despesas durante grande parte do ano fiscal de 2008 que já não realizaria se tivesse previsto ou fosse já do seu conhecimento que a taxa de tributação iria ser agravada.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=