TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

54 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL técnico-profissional e deontológica adequada ao início da actividade, competindo aos serviços de estágio da Ordem dos Advogados assegurar o ensino dos conhecimentos de natureza técnico-profissional e deon- tológica e o funcionamento do inerente sistema de avaliação. Anteriormente à referida deliberação, a inscrição preparatória como advogado estagiário na Ordem de Advogados estava aberta aos licenciados em Direito por cursos universitários nacionais ou estrangeiros ofi- cialmente reconhecidos ou equiparados, nos termos do artigo 187.º do EOA, sem que o Estatuto ou o RNE previsse a necessidade de realização de qualquer exame prévio de avaliação. Com a introdução dos preceitos acima transcritos, no RNE, essa inscrição, relativamente aos candidatos que tenham obtido a sua licenciatura após o Processo de Bolonha, passou a estar condicionada à aprovação em exame de acesso ao estágio organizado pela Ordem dos Advogados. Na verdade, sendo um exame de acesso ao estágio, como refere a epígrafe do referido artigo 9.º-A, e o texto do seu n.º 1, é óbvio que a finali- dade do mesmo é seleccionar, entre os candidatos, apenas aqueles que revelem os conhecimentos necessários ao ingresso no estágio de advocacia, o que é confirmado pelo disposto no n.º 4 do mesmo artigo 9.º-A. Quem não obtiver a aprovação neste exame não se poderá inscrever na Ordem dos Advogados, como advogado estagiário. O exame consiste numa prova escrita sobre uma das matérias jurídicas elencadas no n.º 2 do artigo 9.º-A, através do qual a Ordem dos Advogados procurará aferir do nível de conhecimentos jurídicos dos candidatos, com vista a apurar se a sua preparação científica é suficiente para receberem a subsequente for- mação profissional. No novo preâmbulo do RNE, aprovado pela mesma deliberação n.º 3333-A/2009, do Conselho Geral da Ordem dos Advogados, é possível surpreender a motivação que presidiu à consagração deste exame: «(…) a massificação do ensino do Direito em Portugal, devida sobretudo à multiplicação de universidades privadas, conduziu a uma diminuição generalizada da sua qualidade, com repercussões negativas em todas as profissões jurídicas. No que à Advocacia diz respeito, verificou-se que a Ordem dos Advogados não foi capaz de, ao longo dos anos, obstar às consequências nefastas daquela situação. A Advocacia massificou-se, passando de cerca de 6.000 Advoga- dos em meados dos anos 80, para mais de 30 000 na actualidade. O resultado mais visível desse fenómeno foi a degradação da profissão, com perda da sua secular dignidade funcional e prestígio social. Hoje, existem em Portugal milhares de Advogados que lutam desesperadamente pela sobrevivência profissional que só poucos conseguirão. O rácio de Advogados por habitantes aproxima-se do dos países da América Latina, afastando Portugal dos modelos da Advocacia existente nos países desenvolvidos da Europa. Embora com um atraso de vários anos ainda não é tarde para proceder às reformas que invertam a situação e criem as condições para que a Advocacia portuguesa volte a ser uma profissão com a dignidade e a qualidade que foram a individualizaram ao longo dos séculos. E a primeira de todas as reformas tem, necessariamente, de incidir nos mecanismos de acesso à profissão, nomeadamente a formação profissional, a qual, em bom rigor, não é objecto de reformas de fundo, praticamente, desde a criação do actual modelo, ou seja, desde há cerca de 20 anos. Por isso impõe-se proceder a alterações no Regulamento Nacional de Estágio de molde a adaptar a formação de novos Advogados às mudanças que ocorreram na sociedade (…) Importa, por outro lado, garantir que os licenciados que pretendem ingressar no estágio na Ordem possuam os conhecimentos jurídicos necessários à formação profissional que irão receber. Daí que a Ordem tenha o direito, que é simultaneamente um dever, de verificar previamente a preparação científica de que são portadores esses candidatos à Advocacia. Este objectivo é essencial à boa formação profissional dos futuros Advogados, sobretudo num país onde o ensino jurídico se degradou acentuadamente devido à sua massificação, em consequência da proliferação de cursos de direito.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=