TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

440 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Neste contexto, não são de acolher as dúvidas colocadas quanto à aceitabilidade da nova denominação e da nova sigla que, em harmonia com o prescrito pelas normas pertinentes dos seus estatutos, o partido político “Movimento Mérito e Sociedade” pretende adoptar. Quanto à nova denominação, foi suscitado o problema da eventual confundibilidade entre “Partido Liberal Democrata” e “Partido Social Democrata”. Contudo, não é de admitir que, após décadas de fami­ liarização dos eleitores portugueses com a segunda denominação, a expressão “liberal democrata”, a ser adop- tada, implique sério risco de se apresentar como expressão enganosamente semelhante à já conhecida. É, pelo contrário, razoável pensar que, décadas volvidas, os eleitores portugueses detêm uma percepção suficiente da distinção de significados que separa os termos liberal e social. Do mesmo modo, parece razoável contar com a suficiência dessa percepção no que diz respeito à dis- tinção entre as siglas PLD (que o requerente pretende adoptar) e as siglas já existentes PSD e PND, assim se explicando aliás que o Tribunal, no Acórdão n.º 298/03, que ordenou a inscrição no registo do Partido da Nova Democracia, não tenha posto quaisquer objecções quanto à aceitabilidade da sigla que o identificaria (PND), pela sua possível confusão com outra, já existente (PSD). É este mesmo juízo, que então levou a que se não pusesse em causa a aceitabilidade da sigla, que agora se reitera. 7.   Colocaram-se ainda dúvidas sobre a aceitabilidade do novo símbolo que o requerente pretende adop- tar, com o fundamento segundo o qual “se poderá facilmente confundir [tal símbolo] com o [símbolo] da religião católica, da pomba, expressão do Espírito Santo, elemento da Santíssima Trindade.” A proibição de que os partidos usem emblemas que sejam confundíveis com símbolos religiosos tem, como já vimos, assento constitucional. Os trabalhos da Constituinte, atrás referidos, esclarecem quanto ao sentido e razão de ser dessa proibição. Pretendeu-se com ela, antes do mais, pôr um limite à face externa dos partidos que garantisse a liberdade religiosa , porque se sabia bem “que [o]s nomes, siglas ou designações cunhados religiosamente, com um sentido especificamente religioso, não podem ser usados em política, porque serão naturalmente abusados, se assim acontecer” ( idem , p. 1184). Tudo isto, porém, sem deixar de se ter em conta que, como ficou expresso no n.º 3 do artigo 51.º da CRP, esses limites à face externa dos partidos não deveriam prejudicar “a filosofia ou ideologia inspiradora do seu programa.” Significa tudo isto que devem ser circunscritas as situações em que se considera que o “emblema” esco­ lhido pelo partido não pode ser aceite, por violar a proibição constitucional e legal de confundibilidade ou relação gráfica com um signo ou “emblema” religioso. Para que tal suceda, parece necessário que haja uma inequívoca identidade de sentido entre o símbolo do partido e o símbolo religioso, de tal modo que não possa deixar de concluir-se que o conhecimento do primeiro levará necessária ou muito provavelmente ao conhecimento do segundo, de acordo com os parâmetros normais da percepção comum das coisas. É razoávelpensar-se que não ocorrerá, como dado necessário, essa conexão de sentido (entre símbolo partidário e símbolo religioso) sempre que a realidade sinalizada pelo segundo o puder ser, também, por outras vias, que não apenas a que foi adoptada pelo “emblema” partidário; ou, inversamente, sempre que ao “emblema” partidário puder ser atribuído, na significação comum, outro ou outros sentidos, para além daquele que é próprio do símbolo religioso. A realidade que se invoca como sendo confundível com o “emblema” que o “Movimento Mérito e Sociedade” pretende agora adoptar (o “Espírito Santo, como elemento da Santíssima Trindade”) tem sido simbolizada por diversas formas. Enquanto força sobrenatural, de natureza carismática, que se faz sentir no mundo físico ou psíquico, ou enquanto virtude divina que é recebida pelo homem sob a forma de sopro vital ou purificador, o “espírito” tem tido, na tradição religiosa, múltiplas representações. Simbolizam-no também, por exemplo, o fogo, o vento (o “halo” vital), a água ou o óleo purificadores ( Enciclopédia Verbo Luso-Brasileira de Cultura, Tomo 7, p. 1250). Por ouro lado, a pomba, enquanto símbolo, é ela também plurisignificativa, adquirindo sentidos vários na cultura secular: pense-se no seu uso frequente enquanto sinal da paz, ou enquanto elemento recorrente de certa linguagem pictórica (as “pombas” de Magritte).

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