TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011
43 acórdão n.º 214/11 reserva de regulamento as dúvidas de constitucionalidade do requerente. (…)», não pode afirmar-se, sem outras razões, que ocorra violação do princípio de separação de poderes, tanto mais que nada obsta, em abstracto, que um acto de natureza legislativa revogue um acto de natureza regulamentar; aliás, diga-se em abono da verdade, que nem essa foi a questão colocada, nem a tese que obteve vencimento o coloca em crise. Assim, neste restrito aspecto, os artigos 2.º e 3.º do Decreto sub judicio se não deverão ter como incons titucionais. 2. As razões da discordância encontram-se, essencialmente, quanto à afirmada não ocupação pelo acto legislativo em causa – Decreto n.º 84/XI da Assembleia da República – do espaço resultante da revogação do Decreto Regulamentar n.º 2/2010, de 23 de Junho, que disciplinava o processo de avaliação do desempenho dos docentes do ensino básico e secundário das escolas públicas, desde logo, por se entender que aquele acto legislativo se não limita a revogar, mas diz algo mais, como se infere do conteúdo vertido na norma do artigo 2.º Efectivamente, “apropriando-se” do clausulado referente ao Despacho n.º 4913-B/2010, de 18 de Março, alargando e generalizando a sua aplicação a um universo diferente do nele mencionado e bem mais amplo, incutindo-lhe desta forma um cunho mais abstracto e generalizado, impor-se-á concluir que a tal acto se não poderá negar o objectivo de ocupar o espaço deixado em aberto pela revogação do Decreto Regula- mentar n.º 2/2010, de 23 de Junho, regulando, ainda que, reconheça-se, fazendo uso de uma técnica legis- lativa que não prima pela clareza (matéria não susceptível de ser sindicada por este Tribunal Constitucional) e sem que a ocupação possa ser considerada plena. Ao agir de tal forma, a Assembleia da República fê-lo ao abrigo do disposto no artigo 161.º, alínea c), da Constituição da República Portuguesa, sendo que se não moveu, como se deixou já afirmado supra , em matéria de reserva de outro órgão ou de exclusão da sua competência, havendo que extrair dessa conduta, no mínimo, uma revogação implícita do n.º 4 do artigo 40.º do Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de Abril (sucessivamente alterado pelos Decretos-Leis n. os 105/97, de 29 de Abril, 1/98, de 2 de Janeiro, 35/2003, de 17 de Fevereiro, 121/2005, de 26 de Julho, 229/2005, de 29 de Dezembro, 224/2006, de 13 de Novembro, 15/2007, de 19 de Janeiro, e 35/2007, de 15 de Fevereiro). Dir-se-á que, ao regular tal matéria em causa, o fez sem a esgotar, já que o fez para um período determi- nado e deixando em aberto um espaço susceptível de ser ocupado pela actividade regulamentar do Governo, do que nos dão notícia as Resoluções da Assembleia da República n. os 93/2011 e 94/2011, publicadas no Diário da República , 1.ª série, n.º 81, de 27 de Abril de 2011, na medida em que aí se deixa, sob a forma de recomendação, alguns parâmetros por forma a ser preenchido esse possível espaço, diga-se, agora, de forma adequada e em total respeito da autonomia do Governo no exercício dessa actividade complementar, não incorrendo no vício que foi notado ao artigo 1.º Aliás, como bem se explicita no texto do Acórdão, «(…) A Assembleia da República pode, mediante um acto legislativo, não só modificar essas opções fundamentais, como até pré-ocupar a regulação do pro- cedimento através do qual se procede à avaliação (o modelo). Se assim proceder, o Governo no exercício do poder regulamentar, se ainda for necessário ou restar qualquer margem de complementação, de acordo com o princípio da prevalência de lei, e a Administração escolar, em obediência ao princípio da legalidade, estarão vinculados a agir em conformidade (artigo 266.º da CRP)». Acresce que da conduta da Assembleia da República, ao produzir o acto legislativo em causa, e dos elementos que instruem os autos se não poderá extrair a conclusão de que se possa estar perante uma intro missão intolerável e reiterada do poder legislativo na esfera do executivo, antes se configurando uma situa- ção isolada não referida a um domínio heterónomo de competência, e, mau grado haver de admitir-se alguma limitação daí resultante para o executivo (resultante, diga-se, do funcionamento democrático de um Governo apoiado por uma maioria relativa), sempre se haverá de convir que, como se afirmou no Acórdão n.º 1/97 (publicado no Diário da República , I Série, de 5 de Março), «(…) não será uma esporádica e excepcional limitação do espaço de manobra do Governo, sem qualquer deliberada e reiterada substituição funcional pela Assembleia da República, que poderá violar o artigo 185.º da Constituição» (note-se, actual- mente, artigo 182.º).
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