TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011
416 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de utilidade pública, a natureza do solo e do subsolo, a configuração do terreno e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos pendentes e outras circunstâncias objectivas suscep- tíveis de influírem no respectivo cálculo” (artigo 27.º, n.º 3). É neste quadro que importa apreciar a validade da norma sub judicio . 5. Sustenta a recorrente que tal norma viola os princípios da igualdade e da justa indemnização, con- sagrados, respectivamente, no artigo 13.º e 62.º, n.º 2, da Constituição. No entender da recorrente, tal violação resultaria da circunstância de o expropriado ficar numa situação mais vantajosa comparativamente com aquela em que fica o não‑expropriado, o que seria intolerável face àqueles princípios constitucionais. Com efeito, a classificação de solos como RAN implica severos constrangimentos para os seus pro prietários, pois, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 8.º do Decreto‑Lei n.º 196/89, de 14 de Junho (é esse o diploma aplicável ao caso dos autos, sendo que o mesmo foi entretanto revogado pelo Decreto-Lei n.º 73/2009, de 31 de Março), tais solos passam a ser exclusivamente afectos à agricultura, sendo proibidas todas as acções que diminuam ou destruam as suas potencialidades agrícolas, só em casos excepcionais, pre- vistos no n.º 2 do artigo 9.º desse diploma, podendo a tais solos ser dada utilização não agrícola. Tal significa que a classificação de solos como RAN repercute-se, inevitavelmente, no seu valor, o qual sofre uma redução significativa relacionada com as limitações inerentes ao estatuto dessa reserva. Não obstante, a lei não prevê qualquer indemnização ao proprietário de terreno que veja parcelas do mesmo serem integradas em RAN, opção essa que não merece qualquer censura constitucional, pois o Tribunal Constitucional tem entendido que as proibições, designadamente a proibição de construção, res trições ou condicionamentos à utilização dos terrenos integrados em RAN, são uma mera consequência da vinculação situacional da propriedade que incide sobre eles, pelo que são encaradas como meramente con- formadoras do conteúdo do direito de propriedade, não gerando por isso qualquer direito de indemnização autónomo (vide, nesse sentido, Acórdão n.º 347/03). Ora, a atribuição de uma indemnização por expropriação de parcela integrada em RAN, calculada com base no critério estabelecido para “solo apto para construção”, abstraindo, assim, das proibições decorrentes da classificação do solo como RAN, teria como consequência um resultado inaceitável: o expropriado conse- guiria obter pela parcela expropriada um valor que o proprietário de prédio vizinho não expropriado – com idênticas características e também classificado como RAN – jamais lograria obter caso o pretendesse alienar no mercado. A injustiça da indemnização, assim calculada, é ainda mais evidente se se considerar que todo o desenho legal dos diferentes critérios referenciais a adoptar para efeitos de cálculo do valor da indemnização por expropriação tem na sua base a natureza do solo, sendo a qualificação do mesmo como “apto para cons trução” ou como “solo para outros fins” determinante. Ora, a partir do momento em que a lei opta por estabelecer critérios referenciais que assentam na natu reza do solo, vir ela, posteriormente, admitir que o cálculo do valor da indemnização se processe através de um critério que abstrai da natureza do solo é, em si mesmo, contraditório, desrazoável e, por isso, arbitrário. No sentido da inconstitucionalidade das normas contidas no n.º 1 do artigo 23.º e no n.º 1 do artigo 26.º do CE, quando interpretadas no sentido de incluir na classificação de “solo apto para construção” e, consequentemente, de como tal indemnizar, o solo, inserido em RAN, expropriado para implantação de vias de comunicação, decidiu o Tribunal Constitucional no seu Acórdão n.º 275/04. 6. Sucede, porém, que o pressuposto de que parte o entendimento acabado de expor, e acolhido no referido Acórdão do Tribunal Constitucional, é inaplicável ao caso dos autos. Recorde-se que, inicialmente, a decisão arbitral, tendo classificado a parcela expropriada como “solo apto para construção”, fixara o valor da indemnização a pagar aos expropriados em € 545 720,68, um mon- tante muito além dos € 271 315,15 a que se chegou na decisão recorrida através da aplicação do critério acolhido na norma sub judicio .
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