TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011
393 acórdão n.º 164/11 Ao dispor que a “presente lei se aplica aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor”, está o artigo 3.º da Lei n.º 14/2009 a determinar que o regime novo nela fixado quanto a prazos de caducidade de acções de investigação de paternidade valha também para eventos pretéritos. Tanto basta para que se conclua pela sua inconstitucionalidade. III – Decisão Pelos fundamentos expostos, o Tribunal decide: a) Julgar inconstitucional, por violação do n.º 3 do artigo 18.º da Constituição, a norma constante do artigo 3.º da Lei n.º 14/2009, de 1 de Abril, na medida em que manda aplicar, aos processos pen- dentes à data da sua entrada em vigor o prazo previsto na nova redacção do artigo 1817.º do Código Civil, aplicável por força do artigo 1873.º do mesmo Código; b) Consequentemente, negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida quanto ao juízo de inconstitucionalidade. Lisboa, 24 de Março de 2011. – Maria Lúcia Amaral – Vítor Gomes – Ana Maria Guerra Martins (ven- cida conforme declaração anexa) – Carlos Fernandes Cadilha (entendi que a norma de direito transitório em causa não estabelece uma restrição ao direito fundamental à identidade pessoal mas um mero condiciona- mento ao exercício desse direito através da fixação de um prazo de caducidade da acção de investigação de paternidade, e não se encontra coberto pelo requisito a que se refere o artigo 18.º, n.º 3, da CRP, e que, por outro lado, o estabelecimento desse prazo era perfeitamente expectável e não afecta de modo inadmissível a legítima expectativa do interessado; pronunciar-me-ia, por isso, pela não inconstitucionalidade da norma) – Gil Galvão . Declaração de voto Votei vencida pelas razões que a seguir se passam a expor: 1. Sendo a questão de constitucionalidade em apreço no presente recurso relativa à aplicação retroactiva do novo regime de impugnação da paternidade a processos pendentes à data da entrada em vigor da norma transitória constante do artigo 3.º da Lei n.º 14/2009, não se acompanha o Acórdão, desde logo, no que diz respeito ao parâmetro constitucional utilizado para aferir da constitucionalidade da norma sub judice . Em meu entender, o direito fundamental que, eventualmente, poderá vir a ser afectado não será o direi to à identidade pessoal, mas antes o direito de acesso aos tribunais (artigo 20.º, n.º 1, da CRP) para obter uma decisão judicial relativa aos laços familiares de paternidade. Assim sendo, este Tribunal já afirmou por diversas vezes que a fixação de prazos de caducidade para a instauração de acções perante os tribunais portugueses não deve ser qualificada como uma “restrição” ao direito de acesso aos tribunais, antes poderá constituir um “condicionamento” [cfr., recentemente, Acórdão n.º 250/08 (disponível in www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ )] . Sucede, porém, que esta jurisprudência foi proferida a propósito de situações em que a fixação legal de novos requisitos ou pressupostos processuais ocorre em momento anterior ao da propositura da acção e não após a instauração da mesma, como é o actual caso. É que, em regra, a verificação do preenchimento dos pressupostos processuais deve ocorrer de acordo com a lei vigente à data da propositura da acção [cfr., a título de exemplo, n.º 1 do artigo 22.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (aprovada pela Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro)].
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