TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

391 acórdão n.º 164/11 tutelada, e sendo antes concretização do princípio de segurança que justifica a protecção constitucional do caso julgado, se inscrevia ainda na liberdade que o legislador detém para ordenar de forma côngrua o decurso de processos perante os tribunais. Em matéria de fixação legal de prazos para a interposição de acções de investigação da paternidade tem sido porém diversa a posição do Tribunal. Na verdade, desde o Acórdão n.º 99/88 se diz que a subordinação da acção de investigação da pater- nidade a prazos de propositura apresenta contornos tais que nela não podem deixar de estar coenvolvidos vários outros princípios constitucionais, para além dos geralmente constantes do artigo 20.º da CRP ou da tutela da segurança jurídica. É o que decorre do seguinte passo da fundamentação, sempre recordado pela jurisprudência ulterior sobre o tema: «Não se afigura questionável que, seja do direito à integridade pessoal, e em particular à integridade “moral” (artigo 25.º, n.º 1), seja do direito à “identidade pessoal”, pode e deve extrair-se um verdadeiro direito fundamental ao conhecimento e ao reconhecimento da paternidade. De facto, a “paternidade” representa uma “referência” essencial da pessoa (de cada pessoa), enquanto suporte extrínseco da sua mesma “individualidade” (quer ao nível biológico, e aí absolutamente infungível, quer ao nível social) e elemento ou condição determinante da própria capacidade de auto-identificação de cada um como “indivíduo” (da própria consciência que cada um tem de si); e, sendo assim, não se vê como possa deixar de pensar-se o direito a conhecer e a ver reconhecido o pai (…) como uma das dimensões dos direitos constitucionais referidos, em especial do direito à identidade pessoal, ou uma das faculdades que nele vai implicada.» Assim, e por se entender que a circunstância de a lei prever um prazo de caducidade para a acção de investigação poderia ter, em si mesma , consequências negativas quanto ao exercício deste direito “de conhe­ cer e pertencer ao pai cujo é” (Acórdão n.º 99/88), toda a jurisprudência ulterior do tribunal que sobre o tema incidiu adoptou uma estrutura argumentativa baseada no método da ponderação. Colocado, nomea­ damente, perante a redacção dada pelo legislador de 1966 ao n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil, o Tri- bunal procedeu a juízos de ponderação: por um lado, pesaram-se os efeitos que os prazos de caducidade das acções de investigação da paternidade produziriam em posições jurídicas subjectivas, constitucionalmente tuteladas (como as decorrentes dos artigos 25.º, 26.º e 36.º da CRP); por outro lado, pesaram-se as razões objectivas, nomeadamente as de segurança, que justificariam a previsão de tais prazos, bem como outros direitos (como, por exemplo, os da reserva de intimidade do pretenso pai), que também forneceriam justifi- cações no mesmo sentido. O resultado da ponderação nem sempre foi o mesmo. Com efeito – e como bem lembra a decisão recorrida – enquanto nos Acórdãos n. os 99/88 e 413/89, por exemplo, o Tribunal entendeu que havia razões justificativas da proprositura dos concretos prazos que aí estavam em juízo, já noutras decisões ( v. g. 486/04 e 11/05) se decidiu que o prazo de dois anos [a contar da data de maioridade ou emancipação do investigante] se afigurava desproporcionadamente estreito, face aos “outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos” que, na matéria, deveriam ser salvaguardados pelo legislador. É, pois, neste contexto que veio a ser proferido o Acórdão n.º 23/06, atrás referido, em que o Tribunal decide declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil, na medida em que previa, para a caducidade do direito a investigar a paternidade, um prazo de dois anos a partir da maioridade do investigante. A decisão fundou-se na violação das disposições conjugadas dos artigos 26.º, n.º 1, 36.º, n.º 1, e 18.º, n.º 2, da Constituição. 9.   Como já se sabe, não está em juízo, no presente caso, o específico prazo de dez anos [após a maiori- dade ou emancipação do investigante] que o legislador, através da nova redacção dada pela Lei n.º 14/2009, de 1 de Abril, ao n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil, veio peremptoriamente instituir para a propositura de acções de investigação da maternidade – e, assim, por força do artigo 1873.º do mesmo Código, também

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=