TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011
390 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL do Código, um regime “liberalizante”, que não cabe agora descrever, quanto ao tempo de exercício do poder de investigar), seria em princípio esse o Direito vigente sobre a questão, a aplicar pelos tribunais comuns após a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma contida no n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil. No entanto, e perante dúvidas que se colocaram a esses mesmos tribunais quanto à própria conformi- dade desse Direito pretérito face à ordem constitucional vigente, estabeleceu-se orientação jurisprudencial no sentido de se não dar como repristinado o regime de 1910. Perante a inexistência de um prazo que fosse legalmente fixado de caducidade das acções de investigação da paternidade, entendeu-se igualmente (se bem que de forma não inteiramente unânime) que seria de aceitar o princípio da imprescritibilidade de tais acções, que assim se tornariam, portanto, cognoscíveis a qualquer tempo. É a este entendimento jurisprudencial que vem pôr cobro a Lei n.º 14/2009, de 1 de Abril, ao estabe lecer, na nova redacção que confere ao n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil, que as acções de investigação da paternidade só podem ser interpostas durante os dez anos subsequentes à maioridade ou emancipação do investigante. 7. Como já se sabe, não é a fixação legal deste novo prazo de caducidade [das acções de investigação da paternidade] que está em juízo no presente recurso. O que se pede que o Tribunal aprecie é outra questão, relativa à norma de direito transitório inscrita no artigo 3.º da Lei de 2009, que manda aplicar o regime dela constante aos processos pendentes no momento da sua entrada em vigor. Entende a decisão recorrida que tal norma lesa o princípio da protecção da confiança, decorrente do artigo 2.º da CRP, por “projectar retroactivamente, nos processos pendentes à data da (…) entrada em vigor [da lei] (2 de Abril de 2009) as alterações (fixação) dos prazos de caducidade das acções de investigação da paternidade, quando essas acções tenham sido intentadas anteriormente à Lei n.º 14/2009 e posteriormente à publicação do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 23/06 (de 8 de Fevereiro de 2006) e conduzam, em sede de aplicação do referido diploma, à constatação do esgotamento (no “passado”) desse prazo e à consequente inviabilização do prosseguimento dessas acções pendentes à data da entrada em vigor desse mesmo Diploma.” É que, acrescenta- -se, tal projecção retroactiva “frustra intoleravelmente a confiança depositada pelo proponente da acção – confi ança precisamente o levou a propor essa acção – num entendimento perfeitamente consolidado e indiscutível, segundo o qual a propositura dessa acção não estaria sujeita a qualquer prazo.” Vejamos, pois. 8. Em geral, tem o Tribunal entendido que as normas de direito ordinário que estabelecem prazos para a interposição de acções em tribunal não infringem qualquer norma ou princípio constitucional, na medida em que apenas revelam escolhas legítimas do legislador quanto aos vários modos pelos quais podem ser prosseguidos os diferentes valores constitucionais inscritos, em última análise, no artigo 20.º da CRP. Foi o que sucedeu, por exemplo, no caso do Acórdão n.º 247/02, em que estava em juízo a norma do Código de Processo Penal que estabelecia, peremptoriamente, o prazo de um ano [contado a partir do momento em que o detido ou preso fora libertado ou a partir do momento em que fora definitivamente decidido o processo penal respectivo] para a apresentação de pedidos de indemnização contra o Estado, por privação da liberdade ilegal ou injustificada. Entendeu o Tribunal que não era inconstitucional a norma em juízo, por se inscrever no âmbito da livre conformação do legislador ordinário quanto aos termos por que se deve ordenar o processo devido em Direito. O mesmo sucedeu (ainda por exemplo) no caso do Acórdão n.º 310/05, em que estava em juízo norma do Código de Processo Civil que impunha um prazo de cinco anos, contados desde o trânsito em julgado da decisão, para interposição de recurso de revisão. Também neste caso se emitiu juízo de não inconstitu- cionalidade, por se entender que a conformação legislativa de prazos [ aqui, para a interposição de recurso], não afectando por si mesma, e de forma negativa, qualquer posição jurídica subjectiva constitucionalmente
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