TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

355 acórdão n.º 152/11 II – Fundamentação 2. A primeira questão a abordar prende-se com a admissibilidade do recurso interposto ao abrigo da g) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, nos termos da qual “cabe recurso para o Tribunal Constitucional, em secção, das decisões dos tribunais que apliquem norma já anteriormente julgada inconstitucional ou ilegal pelo próprio Tribunal Constitucional.” O recorrente invoca, para este efeito, o Acórdão n.º 275/09. Todavia, não existe absoluta identidade entre as normas referidas no Acórdão n.º 275/09 e as aplicadas na decisão recor- rida, com base nas quais o arguido foi condenado. De facto, o Acórdão n.º 275/09 julgou inconstitucional a norma decorrente da conjugação do tipo genérico do crime de desobediência [alínea a) do n.º 1 do artigo 348.º do Código Penal] com o n.º 3 do artigo 152.º e n.º 8 do artigo 153.º do Código da Estrada. Já a norma aplicada pela decisão recorrida é a do artigo 348.º, n.º 1, alínea a ), do Código Penal, por referência ao artigo 152.º, n. os 1, alínea a ), e 3, do Código da Estrada. 2.1. De acordo com jurisprudência sedimentada do Tribunal, é necessário cumprir dois requisi- tos para se poder recorrer ao abrigo da alínea g) do artigo 70.º da LTC. Diz-se no Acórdão n.º 568/08 (os arestos deste Tribunal citados sem menção do lugar de publicação podem ser consultados em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ ) : «(...) para que um recurso possa ser admitido ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, tem de verificar--se uma dupla relação de identidade: – Em primeiro lugar, exige-se que a norma que o recorrente quer ver apreciada tenha sido efectivamente aplicada pela decisão recorrida, como sua ratio decidendi; – Em segundo lugar – e aqui reside o pressuposto específico desta abertura de recurso para o Tribunal Cons- titucional – tem de haver identidade entre a norma efectivamente aplicada na decisão recorrida e a norma anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional. Não basta que possa ser sustentado que as mesmas razões que levaram a julgar inconstitucional determinada norma justificariam que juízo de igual sentido fosse formulado a propósito da norma aplicada na decisão recorrida (cfr., quanto ao âmbito, aos pressupostos e à razão de ser deste recurso, por exemplo, o Acórdão n.º 586/98, publicado no Diário da República, II Série, de 1 de Março de 1999).» 2.2. Salienta, porém, o Ministério Público nas suas contra-alegações que, apesar de não existir uma integral coincidência entre as normas referidas no Acórdão n.º 275/09 e as constantes da decisão recorrida, com base nas quais o arguido foi condenado, o núcleo essencial mantém-se: o artigo 348.º, n.º 1, alínea a ), do Código Penal e o artigo 152.º, n.º 3, do Código da Estrada. Considera, assim, que a dimensão norma- tiva apreciada e julgada inconstitucional pelo Acórdão n.º 275/09 coincide com a aplicada pela sentença do tribunal a quo , pelo que se verificam os pressupostos de admissibilidade do recurso interposto ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC. De facto, a ratio decidendi de tal decisão assentou na norma julgada inconstitucional pelo Acórdão n.º 275/09; foi determinante para a condenação levada a cabo pelo Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia o facto de o arguido se ter recusado a realizar teste de sangue como prevê o artigo 153.º, n.º 8, do Código da Estrada, cuja norma foi relevante para formulação do juízo de condenação do tribunal a quo . Trata-se de uma situação “em que o tribunal a quo acaba, em termos substanciais (…) por fazer inelutavelmente apelo ao regime jurídico da norma já inconstitucionalizada – não respeitando ou não tendo em conta o sentido e alcance do anterior juízo de inconstitucionalidade emitido pelo Tribunal Constitucional” (Carlos Lopes do Rego, Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tri- bunal Constitucional , Almedina, 2010, p. 149). Conforme tem decidido o Tribunal (Acórdãos n.º 357/06 e n.º 502/07): «(…) a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem admitido recursos interpostos de sentenças de aplicação implícita de normas (vejam‑se, entre outros, os Acórdãos n. os 187/98, 69/92 e 513/97). (…) Por outro lado, exige

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