TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

354 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. A. recorreu para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro (LTC), da sentença proferida em 8 de Fevereiro de 2010 no Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia (4.º Juízo Criminal) pelo qual foi condenado como autor material e sob a forma consumada, pela prática de um crime de desobediência, previsto e punido pelos artigos 69.º, n.º 1, alínea a ), e 348.º, n.º 1, alínea a ), do Código Penal, por referência aos artigos 152.º, n.º 1, alínea a ), e n.º 3, do Código da Estrada, na pena de 100 dias de multa, à razão diária de oito euros e na pena acessória de proibição de condução de veículos a motor de qualquer categoria durante seis meses. Admitido o recurso, o recorrente apresentou a sua alegação, que conclui da seguinte forma: «1. A condenação do recorrente pela prática de um crime de desobediência pela recusa de sujeição a colheita de sangue viola uma decisão do Tribunal Constitucional que, com anterioridade, julgou inconstitucional a norma aplicada pela decisão recorrida, ou seja, o artigo 153.º, n.º 8, do Código da Estrada, o que contende com o princípio de um Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa. 2. O Recorrente não recusou a realização do exame através do método de ar expirado (não tendo o mesmo obti­ do sucesso por motivos imputáveis ao Estado), por um lado, nem tão-pouco recusou o exame médico alternativo à colheita de sangue, por outro lado, do qual, aliás, nem sequer foi devidamente informado pela entidade autuante. 3. O novo conteúdo do normativo em questão – a exigência de que a não realização da colheita de sangue apenas possa ser justificada pela impossibilidade técnica de tal operação médica –, produzido pelo Governo, ob- rigava a uma autorização legislativa da Assembleia da República, por força da alínea c) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição. 4. Devem, assim, como se requer, ser julgadas inconstitucionais as normas constantes nos artigos 152.º, n.º 3, e 153.º, n.º 8, do Código da Estrada, determinando-se a sua desaplicação na Douta Sentença recorrida, assimse fazendo Justiça!» O representante do Ministério Público junto a este Tribunal alegou da seguinte forma: «Nesta conformidade e face ao exposto, conclui-se: 1. De acordo com o decidido pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 275/09, o Governo, ao editar, sem prévia autorização legislativa, o Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23 de Fevereiro, que deu nova redacção ao artigo 153.º, n.º 8, do Código da Estrada, veio retirar aos condutores sujeitos aos exames para detecção do estado de influenciado pelo álcool, o direito de recusar a colheita de sangue para análise. 2. Consequentemente, a norma extraída a partir da conjugação do artigo 348.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal e dos artigos 152.º, n.º 3, e 153.º, n.º 8, ambos do Código da Estrada, na redacção fixada pelo Decreto-Lei n.º 44/2005, na interpretação segundo a qual constitui crime de desobediência a recusa a ser-se submetido a colhei­ ta de sangue para análise, com a finalidade e nas condições anteriormente referidas, foi julgada organicamente inconstitucional, por violação do artigo 165.º, n.º 1, alínea c) , da Constituição. 3. Assim, se se concordar com tal entendimento, deverá ser julgada organicamente inconstitucional a norma que se extrai da conjugação do artigos 348.º, n.º 1, alínea a) , do Código Penal com o artigo 152.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, do Código da Estrada, concedendo-se provimento ao recurso interposto ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.»

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