TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

303 acórdão n.º 110/11 e na medida em que os contenham [alínea b ) do n.º 1 do artigo 356.º do CPP], os documentos constantes do processo podem e devem ser valorados pelo tribunal, independentemente da sua leitura em audiência. Ora, o Tribunal já apreciou esta vertente ou este aspecto geral da questão agora sujeita no Acórdão n.º 87/99, disponível em www.tribunalconstitucional.pt . Como aí se disse, este entendimento não obsta a que as partes participem na produção da prova em audiência, contribuindo para iluminar todos os aspectos relevantes para descoberta da verdade. Tratando-se de documentos que foram juntos com a acusação, o arguido teve todas as possibilidades de os questionar, podendo ainda, na própria audiência, provocar a sua reapreciação individualizada para esclarecer qualquer ponto da sua defesa relativamente à qual entenda que isso seria necessário. Não é, porém, indispensável à satisfação da exigência de que processo assegure todas as garantias de defesa a leitura de toda a prova docu- mental pré-constituída e junta ao processo. Quanto a este tipo de prova, o princípio do contraditório há-de traduzir-se em ter necessariamente de facultar-se à parte não apresentante a impugnação, quer da respectiva admissão, quer da sua força probatória. Com efeito, a consagração constitucional do princípio do contraditório significa, no que à fase de jul- gamento respeita, que nenhuma prova deve ser aceite em audiência, nem alguma decisão deve aí ser tomada pelo juiz, sem que previamente tenha sido dada uma ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra o qual ela é dirigida de contestar a sua admissibilidade, de a discutir e de a valorar. Ora, relativamente a documentos que constem do processo e que tiverem sido indicados na acusação como meio de prova, a res­ pectiva leitura ou exibição pública ritualística, embora se reconheça que poderia servir para realizar de modo mais intenso os objectivos do princípio da publicidade da audiência, nada acrescentaria no capítulo das oportunidades de defesa do arguido. Seria, “um verdadeiro ‘simulacro’ de ‘constituição’ no decurso daquele acto processual de uma prova que, afinal, já existia, de modo anterior e autónomo relativamente ao processo penal em questão”, como se aceita no referido Acórdão. 8. A questão exige, porém, ponderações suplementares quando reveste a especificidade, que o recorte da norma sob apreciação precisamente coloca, de se tratar de documento que, embora constasse do processo desde a fase de inquérito, não foi incluído pelo Ministério Público nos meios de prova indicados na acusação. Esta reserva não significa que se adopte o ponto de partida de que o juiz tenha de limitar os meios de formação da sua convicção ao material probatório fornecido pela acusação e pela defesa. O nosso sistema de processo penal não corresponde a um modelo acusatório puro ou estritamente subordinado ao princípio da discussão, em que o juiz se limitaria a apurar a verdade que resultasse da prova perante si apresentada e produzida pela acusação e pela defesa. O Código consagra um processo de estrutura acusatória, integrado pelo princípio da investigação judicial no domínio da produção de prova, como claramente resulta do n.º 1 do artigo 340.º que dispõe que “o tribunal ordena oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa”. Como se disse no Acórdão n.º 137/02, este princípio significa, “mesmo no quadro de um processo penal orientado pelo princípio acusatório (artigo 32.º, n.º 5, da CRP), que o tribunal de julgamento tem o poder-dever de investigar por si o facto, isto é, de fazer a sua própria “instrução” sobre o facto, em audiência, atendendo a todos os meios de prova não irrelevantes para a descoberta da verdade, sem estar em absoluto [de modo absoluto] vinculado pelos requerimentos e declarações das partes, com o fim de determinar a verdade material”. E, como no mesmo Acórdão se acrescenta – embora aí mobilizando argumentos ordenados ao funcionamento do princípio em sentido favorável ao arguido, que era o sentido da prova cuja admissão então se discutia –, o princípio da investigação ou da verdade material tem valor constitucional, sem embargo da estrutura acusatória do processo penal português. Quer os fins do direito penal, quer os do processo penal, que são instrumentais daqueles, implicam que as sanções penais, as penas e as medidas de segurança, sejam aplicadas, mas apenas sejam aplicadas, aos verdadeiros agentes de crimes, pelo que a prossecução desses fins, isto é, a realização do direito penal e a própria existência do processo penal só são constitucionalmente legítimas se aquele princípio for respeitado. Por outro lado, o princípio da jurisdicionalidade da aplicação do

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