TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

248 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL tribunais, que possam perturbar a serenidade, a isenção e a independência que deve presidir à tomada das decisões judiciais. Não deixando de ter presente a fase processual em que neste processo se verificou a conduta tipificada, podemos dizer que a sua criminalização é plurisignficativa no plano axiológico, sendo múltiplos os bens jurídicos tutelados: além do referido interesse público na realização de uma justiça isenta e independente, poupada a intro- missões de terceiros, a especulações sensacionalistas ou a influências que perturbem a serenidade dos julgadores; o interesse do arguido em não ver publicamente revelados factos que podem vir a não ser considerados provados sem que com isso se evitem graves prejuízos para a sua reputação e dignidade; e o interesse de outras partes ou interve- nientes no processo, designadamente os presumíveis ofendidos, na não revelação de certos factos prejudiciais à sua reputação e consideração social, ou que invadam a esfera da sua vida íntima». Estas razões diversificadas podem ser agrupadas em duas grandes categorias de justificações para a con- sagração de limites à liberdade de imprensa, quando exercitada em relação à prática judiciária: preservar as condições de uma adequada administração da justiça e salvaguardar direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, em colisão potencial com aquela liberdade. 10. A essas razões gerais há a acrescentar razões específicas, atinentes à fase processual em causa – a audiên- cia de julgamento – e aos meios utilizados para a recolha e difusão da informação. Cumpre salientar, na verdade, que o modo operativo dos meios técnicos necessários à tomada de som e ao registo de imagens é de molde a influenciar o próprio desenrolar daquele acto processual, pois alteram o “ambiente” em que ele é praticado e os comportamentos dos intervenientes processuais (cfr. Jorge Baptista Gonçalves, “ O processo penal e os media: algumas reflexões”, in Revista do Centro de Estudos Judiciários , 2005, n.º 3, pp. 73 segs., 90-91). Não estão em causa, apenas, as particulares formas e extensão comunicativas que os meios audiovisuais proporcionam de um acontecimento, uma vez ele produzido, mas também o risco sério de interferência per- formativa no modo da sua produção. Para além da maior ressonância mediática e da mais ampla publicidade que estes meios propiciam, em si mesmos favoráveis a um desejável escrutínio, pelos cidadãos, da função de julgar, mas também propícios a uma montagem de julgamentos paralelos, na praça pública, a captação, em directo, de imagens e de som de um julgamento, com todo o aparato que tal envolve, pode condicionar a actuação, em juízo, de todos quantos são chamados a intervir. É sobretudo esta razão que justifica, cremos, o tratamento diferenciado da recolha de informação, por escrito, e do seu registo fílmico ou fonográfico: enquanto que a primeira é, em princípio, livre, já o segundo depende de autorização. E esta última solução está inteiramente em linha com o princípio 14 do Anexo à Recomendação n.º Rec(2003)13, do Comité de Ministros do Conselho da Europa (transcrita na Revista do Ministério Público, n.º 97 (2004), pp. 167 e segs.), o qual dispõe o seguinte: «As reportagens em directo ou as gravações efectuadas pelos meios de comunicação social nas salas de audiên- cias não devem ser possíveis, salvo se e na medida em que a lei ou as autoridades judiciárias competentes o permi- tam expressamente. Tais reportagens só devem ser autorizadas se delas não resultar risco sério de influência indevida sobre as vítimas, as testemunhas, as partes nos processos penais, os jurados e os magistrados». Como resulta do texto, e o comentário apenso à Recomendação melhor esclarece (designadamente quando refere que as testemunhas e as vítimas “podem sentir-se intimidadas pelas câmaras e meios de comu­ nicação social ou ser conduzidas a posar perante elas”), no horizonte de valoração que determinou um tal regime esteve presente a necessidade de prevenir a possível perturbação para o desenrolar das audiências judiciais das reportagens em directo e gravações efectuadas no seu decurso. 11. Quando, como nos presentes autos, está em causa apenas a transmissão (e não a tomada) de som, efectuada após o decurso da audiência de julgamento e a prolação de sentença, parte das razões justificativas

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