TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

246 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL causa, às quais teve acesso de modo não apurado. Foram reproduzidos, nomeadamente, a audição das per- guntas feitas pelos Juízes e pelo Procurador da República, bem como o depoimento de diversas testemunhas, não havendo sido pedida autorização, ao Juiz Presidente do Colectivo desse tribunal, para a transmissão de qualquer som obtido na audiência. Apesar de a 1.ª instância ter valorado a circunstância de, além da autorização do juiz, não ter também tido lugar a autorização das pessoas que prestaram depoimento, da qual aquela autorização judicial depen­ deria (fls. 675), o Tribunal da Relação, que proferiu a decisão recorrida, fundou a sua decisão na mera ausên­ cia de autorização da autoridade judiciária. Razão pela qual se conhecerá da constitucionalidade da norma do artigo 88.º, n.º 1, alínea b) , do CPP, quando interpretada no sentido de que proíbe, sem limite de tempo, que a comunicação social transmita a gravação do som da audiência de julgamento, contido no suporte magnético do próprio tribunal, sem que tenha havido autorização da autoridade judiciária que preside à fase do processo no momento da divulgação. III. Fundamentação 7. O parâmetro constitucional invocado é a garantia de liberdade de imprensa (artigo 38.º, n.º 1, da Cons­ tituição). Antes, mesmo, de qualquer ponderação com outros bens ou valores constitucionais em colisão, a invo­ cação suscita a questão prévia de saber se, in casu, atentas a autoria (os serviços do próprio tribunal) e a específica finalidade processual da gravação do som, a sua posterior divulgação, para fins mediáticos, não estará, prima facie, fora do âmbito de protecção daquela liberdade. Isso porque a obtenção desse elemento informativo por um órgão da comunicação social poderá estar ferida de ilegalidade, o que, em certo enten- dimento, excluiria esta situação do programa constitucional de protecção da liberdade de imprensa. A ser assim, não estaríamos perante qualquer problema de colisão de direitos fundamentais, pois então este bem não teria de ser considerado. A questão prende-se com o reconhecimento de limites imanentes implícitos aos direitos fundamen- tais. Estes existirão, na óptica de Vieira de Andrade, «sempre que (e apenas quando) se possa afirmar, com segurança e em termos absolutos, que não é pensável em caso algum que a Constituição, ao proteger espe- cificamente um certo bem através da concessão e garantia de um direito, possa estar a dar cobertura a deter- minadas situações ou formas de exercício; sempre que, pelo contrário, deva concluir-se que a Constituição as exclui sem condições nem reservas» ( Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 4.ª edição, Coimbra, pp. 276-277). Para Jónatas Machado ( Liberdade de expressão – dimensões constitucionais da esfera pública no sistema social, Coimbra, 2002, p. 578), «a publicação de conteúdos informativos recolhidos ilegalmente deva[e] ser prima facie protegida, a menos que se prove que a empresa jornalística, ou o jornalista responsável, de alguma forma participaram, como autores morais, na recolha ilegal de informações». Ora, no caso sub judicio , a gravação, em si, efectuada pelos serviços do tribunal, foi lícita, e não se apurou em que circunstâncias concretas esta chegou à posse da jornalista autora da reportagem em que o som foi inserido. Por outro lado, cremos que, para este efeito, se justifica uma separação entre a obtenção da informação e a sua divulgação – em conformidade, até, com a sua previsão em distintas alíneas do n.º 2 do artigo 38.º da Constituição da República Portuguesa (CRP). Ainda que coenglobadas na estrutura complexa da liberdade de imprensa, de que representammanifestações concretizadoras, o facto de certas formas de obtenção não gozarem de tutela jurídico-constitucional não acarreta automaticamente igual tratamento da difusão, uma vez obtido o elemento a transmitir. Nesse sentido se pronunciou o Tribunal Constitucional alemão, em sentença referida, com concordância, por Costa Andrade ( Liberdade de imprensa e inviolabilidade pessoal. Uma perspectiva jurídico- -criminal, Coimbra, 1996, pp. 313-314). Há que ponderar, designadamente, a censurabilidade da conduta

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