TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

176 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Sendo assim, já não se poderá dizer que ela contraria o disposto no artigo 30.º, n.º 4, da Constituição, mesmo quando se entenda que a “faculdade de conduzir” deva ser qualificada como um dos direitos civis a que se reporta aquela disposição, o que se não afigura, aliás, inteiramente líquido. Só há perda de direitos como efeito automático da pena quando tal perda se produz ope legis , isto é, quando resultadirectamente da lei. É um efeito deste tipo que o artigo 30.º, n.º 4, da Constituição proíbe terminante- mente, ao dispor que “nenhuma pena envolve, como efeito necessário, a perda de quaisquer direitos civis, profis- sionais ou políticos”. É que, conforme se reafirmou no citado Acórdão n.º 224/90, com aquele preceito constitucional pretendeu-se proibir que, em resultado de certas condenações penais, se produzissem automaticamente, pura e simplesmente, ope legis efeitos que envolvessem a perda de direitos civis, profissionais e políticos. Mas não se pretendeu impedir que a sentença condenatória pudesse decretar essa perda de direitos em função de uma graduação da culpa, feita casuisticamente pelo juiz. […]» Posteriormente, o Acórdão n.º 53/97 ( Acordãos do Tribunal Constitucional , 36.º Vol., p. 227) julgou não inconstitucional a norma do artigo 12.º, n.º 2, do mesmo Decreto-Lei n.º 124/90, igualmente relativa à inibição de faculdade de conduzir, com os seguintes fundamentos: «Admitindo que a faculdade de conduzir veículos automóveis é um direito civil, é certo que a perda desse direito é uma medida que o juiz aplica e gradua dentro dos limites mínimo e máximo previstos, em função das circunstâncias do caso concreto e da culpa do agente, segundo os critérios do artigo 71.º do Código Penal. Poder- -se-á, assim, dizer que o juiz não se limita a declarar a inibição como medida decorrente de forma automática da aplicação da pena, com mero fundamento na lei (...). A circunstância de ter sempre de ser aplicada essa medida, ainda que pelo mínimo da medida legal da pena, desde que seja aplicada a pena principal de prisão ou multa, não implica, ainda assim, neste caso, colisão com a proibição de automaticidade. A adequação da inibição de conduzir a este tipo de ilícitos revela que a medida de inibição de conduzir se configura como uma parte de uma pena compósita, como se de uma pena principal associa- da à pena de prisão se tratasse, em relação à qual valem os mesmos critérios de graduação previstos para esta última. Com efeito, a aplicação da inibição de conduzir fundamenta-se, tal como a aplicação da pena de prisão ou multa, na prova da prática do facto típico e ilícito e da respectiva culpa, sem necessidade de se provarem quaisquer factos adicionais. Atenta a natureza da infracção, com a inerente perigosidade decorrente dessa conduta, surge como adequada e proporcional a sanção de inibição de conduzir.» Mais recentemente, os Acórdãos n. os 149/01, 586/04 e 79/09 (todos acessíveis na internet em www.tribunalconstitucional.pt) , vieram julgar não inconstitucional a própria norma do artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do CP, remetendo para a fundamentação do citado Acórdão n.º 53/97. A argumentação expendida nos arestos citados, com a qual concordamos, é aplicável mutatis mutandis ao caso em apreço, em que se interpretou o disposto no artigo 69.º, n.º 1, alínea a) , do CP, no sentido segun­ do o qual, com a condenação pela prática do crime previsto no artigo 291.º, n.º 1, alínea a) , do CP, tem lugar, sem necessidade de se apurar qualquer outro requisito, a aplicação da sanção acessória consistente na inibição de conduzir. Foi o Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, que no âmbito da profunda reforma operada no CP intro- duziu neste diploma a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, clarificando o cenário das sanções acessórias aplicáveis por violação do direito rodoviário, o qual nas palavras de Figueiredo Dias era na altura caótico ( Direito Penal Português. Parte Geral. II. As consequências jurídicas do crime , p. 502, da edição de 1993, da Aequitas).

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