TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

166 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL interrogatório do arguido na fase de inquérito é o primeiro momento processual em que o arguido é chama- do a pronunciar-se sobre os factos que lhe são imputados. (xii) Não faz, pois, sentido, que a sanção processual seja mais severa nas hipóteses em que o arguido já se encontrainvestido nessa qualidade processual do que nas situações em que é chamado pela primeira vez ao processo. (xiii) Só uma interpretação do artigo 272.º, n.º 1, do CPP, no sentido de a omissão da realização de interrogatório de Arguido no decurso da fase de inquérito gerar a nulidade insanável prevista no artigo 119.º, alínea e) , do CPP corresponde à concretização dos princípios constitucionais vertidos nos artigos 2.º, 18.º, n.º 2, e 32.º, n.º 1, da CRP, assumindo-se como uma interpretação conforme às garantias de um processo penal ancorado nos princípios do Estado de direito democrático, da restrição mínima de direitos e das garantias de defesa. (xiv) Sendo, consequentemente, inconstitucional, por violação de tais princípios, a interpretação normativa constante da decisão recorrenda nos termos da qual omissão da realização de interrogatório de arguido no decurso da fase de inquérito gera a nulidade dependente de arguição (e, consequentemente, sanável) pre- vista no artigo 120.º, n.º 2, alínea d) , do CPP. (xv) A interpretação, patente na decisão recorrenda, segundo a qual a infracção criminal prevista no artigo 291.º, n.º 1, não pressupõe, para a respectiva imputação ao agente, a verificação de um perigo concreto para bens jurídicos alheios é inconstitucional por violação dos princípios legais vertidos nos artigos 2.º, 18.º, n.º 2, e 29.º, n.º 1, todos da CRP. (xvi) Neste tocante, o tribunal a quo interpretou a norma legal constante do artigo 291.º, n.º 1, do Código Penal como se aí estivesse contida a infracção de perigo abstracto acolhida no artigo 292.º, do mesmo Código. (xvii) Ao não ter logrado estabelecer qualquer nexo de imputação entre a actuação do recorrente e a produção de um perigo concreto para bens jurídicos alheios, o tribunal a quo pretendeu atribui-lhe a responsabilidade por um resultado-dano, tentando fundar a existência de perigo concreto numa espécie de argumento de “maioria de razão”, o que só evidencia a inexistência de tal perigo concreto. (xviii) A pena acessória prevista no artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal pressupõe, para a sua aplicação, uma ponderação de necessidade de prevenção não coberta pela sanção principal (multa ou prisão) cominada no artigo 291.º, n.º 1, do mesmo Código. (xix) Não se trata de uma medida de segurança, mas de uma pena acessória, diversa e autónoma face à pena principal e cuja aplicação não constitui decorrência necessária da condenação pela prática do crime previsto no artigo 291.º, n.º 1, do Código Penal. (xx) Interpretação diversa da norma constante do artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal – e foi nesse sentido que a interpretou o tribunal a quo – no sentido de a sanção aí prevista constituir consequência necessária e automática da condenação pela prática do crime previsto e punido no artigo 292.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal redunda em inconstitucionalidade material, por violação dos princípios do Estado de direito democrático, da restrição mínima de direitos, liberdades e garantias, da legalidade criminal, na vertente lex stricta e da proibição de perda de direitos como decorrência de uma condenação criminal, pre- vistos, respectivamente, nos artigos 2.º, 18.º, n.º 2, 29.º, n.º 1 e 30.º, n.º 4, todos da CRP. […]» O Ministério Público contra-alegou e concluiu pela seguinte forma: «[…] 1. A decisão recorrida não aplicou a norma do artigo 291.º, n.º 1, do Código Penal, na dimensão normativa que o recorrente pretende ver apreciada e que vem identificada nos pontos V e VI do requerimento de interposição do recurso para este Tribunal. 2. Por falta de um pressuposto de admissibilidade do recurso, não deverá, pois, conhecer-se do recurso, nesta parte.

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