TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

158 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de vista da sua conformidade constitucional. Muito pelo contrário, a questão posta – no fundo, a questão das consequências da não apresentação, pelo Ministério Público, da referida declaração −, só faz sentido, como é evidente, assumindo como um dado a exigibilidade dessa declaração. O cerne da questão a decidir pode ser definido como o de saber se, não tendo o Ministério Público desenvolvido “as diligências necessárias para que o recurso fosse considerado como entrado em tempo [leia- -se, não tendo o Ministério Público apresentado declaração de pretender recorrer], então é inexorável a sua intempestividade”, como se pode ler no acórdão recorrido. Representando a exigência dessa declaração “uma aproximação ao regime das partes sujeitas ao pagamento da multa”, a questão, reportada ao enunciado do n.º 6 do artigo 145.º do CPC, pode desdobrar-se em duas apreciações sucessivas. A primeira consistirá em saber se, sendo a declaração um substituto da multa, deve reger, em relação a ela, por respeito do princípio de igual tratamento, o disposto, quanto à multa, naquele preceito, isto é, se, tendo o recurso sido interposto dentro do prazo adicional de três dias, mas omitida a declaração de querer recorrer, havia ou não lugar à notificação para a sua apresentação. Dada a posição assumida pelo tribunal recorrido, haverá depois a decidir se, não tendo havido essa notificação, dentro daquele prazo, é constitucionalmente conforme considerar que ela já não é possível. Em boa lógica de fundamentação, só uma resposta positiva à primeira questão justifica o trânsito para a segunda, pois, se a norma for interpretada como referível apenas à multa, e não já à declaração, entendida esta (numa dada interpretação) como exigível ao Ministério Público, é evidente que o a questão do não cum- primento do n.º 6 do artigo 145.º (na parte em que impõe a notificação) não chega sequer a colocar-se. Ora, tendo o tribunal recorrido, depois de se debruçar extensamente sobre a possibilidade de cumprimento desse acto, no momento processual em que emite a sua decisão, concluído pela sua inviabilidade, compreende-se, em face disso, que o Ministério Público tenha considerado, nas suas alegações, que «a decisão perfilha, em- bora implicitamente, o entendimento de que a lei comporta a notificação oficiosa ao Ministério Público nos termos do aludido artigo 145.º, n.º 6, do CPC». Mas, em nosso juízo, a estrutura argumentativa e o teor da fundamentação da decisão recorrida não se adequam a este entendimento. Quando começa a abordar a questão do cumprimento do disposto no n.º 6 do artigo 145.º (a fls. 1431 dos autos), a propósito da invocada violação do princípio da igualdade, o Tribunal da Relação do Porto perspectiva-a, de imediato, sob o prisma da extemporaneidade, nessa instância e fase proces- sual, da apresentação da declaração e, portanto, de uma notificação para esse efeito. Mas, de modo algum o faz por ter dado como certa a aplicabilidade a esse acto do disposto, naquela norma, quanto ao pagamento da multa. Que assim não é resulta, ainda que a afirmação não prime pela clareza, do que se diz, in fine da funda- mentação, a título de complemento do anteriormente exposto, e chamando à colação (em itálico) um passo de um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça: «Mas ainda por outra razão improcederia a alegada violação do princípio da igualdade. Como sabemos este princípio não reclama uma igualdade métrica nas várias actuações: “a igualdade de que se trata, não sendo matemática nem lógica, deve avaliar-se no contexto global da estrutura lógico-material da acusação e da defesa e da sua dialéctica e não, propriamente, em cada acto processual. Logo, relativamente a um acto concreto, a mera constatação de que não são exactamente iguais os direitos e deveres (…) só por si, não é suficiente para se ter como necessariamente violado o aludido princípio”». A interpretação mais plausível deste trecho, referido ao que nos autos está em causa, é a de que o trata- mento não absolutamente igualitário dos ónus de apresentar declaração da vontade de recorrer e de pagar a multa não fere o princípio da igualdade. Esta é uma “outra razão” que se acrescenta à primeira, ambas concorrendo, no mesmo sentido, para fundamentar a decisão. Quer dizer, a questão de base da aplicabilidade à declaração do disposto no n.º 6 do artigo 145.º, devidamente suscitada no recurso de apelação do Ministério Público e enunciada no relatório do acórdão recorrido, não é neste equacionado como a questão central e prévia que é, mas como uma segunda componente da ratio decidendi , sendo a resposta que lhe é dada, não a justificação para passar, em termos linearmente sequenciais, a um segundo patamar da apreciação, mas “outra razão” paralelamente coadju- vante para concluir que não há violação do princípio da igualdade. Tendo encontrado, na intempestividade da

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=