TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

119 acórdão n.º 26/11 (…) Assim entendido, o princípio da culpa pode ser pressuposto da imposição da sanção (fundamento), mas não é um factor constitucionalmente necessário da sua medida concreta (limite individual), não significando a cominação de uma multa contravencional fixa, por si só, a violação dos artigos 1.º e 27.º, n.º 1, da Constituição”. Este juízo, firmado a propósito de uma contravenção punida com multa, foi expressamente estendido às con- tra-ordenações punidas com coima, “porque estas sanções significam exactamente o mesmo na esfera jurídica do respectivo destinatário: apenas e só sacrifício patrimonial”. Pode concluir-se deste juízo, tomado em Plenário, que o Tribunal, não rejeitando a vigência, no domínio contra-ordenacional, dos princípios da culpa, da igualdade e da proporcionalidade, admitiu uma diferente grada- ção da sua força impositiva, nessa área sancionatória. No caso concreto, o Tribunal pronunciou-se pela não inconstitucionalidade da cominação da multa fixa em apreciação. Mas, nessa decisão, pesaram decisivamente três factores especificamente caracterizadores da medida sancionatória em causa. Foi entendido, por um lado, que ela aparecia “como razoavelmente proporcionada relativamente à gama de comportamentos susceptíveis de recondução ao concreto tipo de ilícito» o que, só por si, garantia um respeito adequado pelos princípios em presença. Salientou-se também estarmos em face da prestação de um serviço em massa «em que a eventual diversidade das motivações individuais é pouco significativa no que revela de atitude perante a ordenação do comportamento social que se quer assegurar e é indiferente no plano das consequências desse comportamento para o regular funcio­ namento do sistema de transportes colectivos de passageiros”. Considerou-se, por último, que, sendo a multa não graduável “determinada por um método de cálculo que ainda reflecte a gravidade concreta da infracção”, ela “não parece afastar-se de montantes razoavelmente suportáveis pelo comum das pessoas”. Tratando-se, como no caso, de quantias de montante pouco elevado “haverá um claro desfasamento entre o investimento na recolha séria de elementos para essa tarefa diferenciadora e a sua expressão prática, o que também é lícito ao legislador levar em conta, numa afectação racional de meios”. Sendo estes fundamentos de decisão especificamente atinentes à norma em juízo, deixou-se em aberto a posição a tomar quanto a configurações normativas de multas ou coimas não individualizáveis que não obedeçam ao mesmo figurino. Ora, nenhum desses fundamentos pode valer, quanto à norma sub judicio. Há que ponderar, antes de mais, que, neste caso, a total insensibilidade a factores pessoais, na determinação da medida da sanção, não resulta apenas da irrelevância de elementos de responsabilização reportados à culpa, em con- creto, do responsável. É a própria moldura sancionatória aplicada que é fixada em função de um tipo de agente que não corresponde ao do sujeito que, a título subsidiário, vem a ser responsabilizado. Na verdade, pessoas colectivas e pessoas físicas são entes morfologicamente bem distintos, com estrutura e grandeza de património tipicamente diferenciáveis. Em resultado, a incidência patrimonial subjectiva, o “grau de sacrifício” que uma mesma multa ou coima comporta, não são idênticos, quando aplicadas a uma pessoa colectiva ou a um sujeito individual. O que o legislador, de forma praticamente constante e por um imperativo de justa medida, leva em conta, fixando valores mais elevados para os limites mínimo e máximo das sanções a aplicar a entes colectivos. Tal como vem fixada no artigo 7.º-A do RJIFNA, a responsabilidade subsidiária subverte esse critério diferen- ciador, ao pôr a cargo do administrador o pagamento de uma multa ou coima fixadas dentro de uma moldura esta- belecida por reporte a uma categoria de sujeitos de natureza distinta — a pessoa colectiva responsável pela infracção tributária que deu motivo à sanção. Porque determinadas dentro de uma moldura ajustada à natureza própria da personalidade colectiva do devedor primário, a multa ou coima, quando passam a incidir, em igual medida, sobre a pessoa individual chamada, a título subsidiário, à responsabilidade, revelam-se, à partida, desproporcionadamente agravadas. E, ao parificar, quanto ao objecto, situações de responsabilidade que, pelo menos do ponto de vista da natureza do sujeito responsável, são estruturalmente desiguais, a solução gera desconformidades com o que o princípio da igualdade exigiria. Para além desta inadequação que contamina, in radice, todo o processo sancionatório da conduta culposa dos administradores, não pode ignorar-se que esta, pela heterogeneidade de comportamentos potencialmente

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