TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011

116 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL satisfação do direito do credor no seio da primeira, pelo que esta situação funciona como uma espécie de pressuposto negativo da constituição da responsabilidade que passa a recair (ou a recair também) sobre os administradores, já que estes são chamados a responder na decorrência da constatada impossibilidade de realização coactiva, à custa do patri­ mónio do devedor originário, da obrigação de pagar a multa ou coima. Mas há que atentar nos termos precisos em que se processa essa responsabilidade. Ela não se activa apenas por força daquela vicissitude, ocorrida na esfera jurídica do devedor em falta. De facto, não basta a insuficiência patrimonial do devedor originário para que o devedor subsidiário seja chamado à responsabilidade, como é timbre de um regime de subsidiariedade autêntica. A isso tem que acrescer, como pressuposto necessário, um facto da autoria do devedor subsidiário e a ele imputável: a causação culposa da situação obstativa da satisfação do crédito emergente da multa ou coima. É esse dado que justifica que os administradores, ainda que não vinculados ao dever de pagar a coima, sejam responsabilizados pela não realização do crédito correspondente, em sede da execução movida, a título primário, contra o devedor. Como acentua o Acórdão n.º 129/09 – e independentemente da qualificação da responsabilidade por que opta –, é, pois, absolutamente certo que os administradores e gerentes respondem apenas quando verificado um facto próprio, autónomo em relação à infracção contra-ordenacional, com base “num comportamento pessoal”. Ainda que como condição primeira da situação de responsabilidade esteja a impossibilidade de efectivar as consequências sancionatórias dessa infracção, contra a pessoa colectiva que a cometeu, na génese última dessa situação releva, como factor adicional sine qua non, uma conduta própria, determinante daquela impossibilidade. Não há, assim, a automática transposição, sem mais, para a esfera de um sujeito, da responsabilidade inicial- mente gerada na esfera de um outro, por força de factores exclusivamente atinentes à esfera jurídica deste último. A norma não põe a cargo dos administradores uma responsabilidade por factos alheios à sua esfera de domínio e de actuação voluntária. Antes os vincula ao pagamento de um débito para cuja insatisfação foi causalmente deter- minante uma conduta pessoal culposa. Este requisito, se não permite, em nosso entender, a “conversão” do valor patrimonial da coima em “dano” (como frustração da aquisição de um valor patrimonial pelo credor), com a consequente qualificação da respon- sabilidade como “responsabilidade civil”, autonomiza-a suficientemente, evidenciando que estamos perante uma responsabilidade com um fundamento não inteiramente coincidente com o da originária. O chamamento do gerente ou administrador à responsabilidade não se dá por força dos mesmos factores de imputação que conduziram à responsabilidade da pessoa colectiva, meramente redireccionados, por um meca­ nismo de transmissão, para a esfera debitória daquele sujeito. Dá-se porque esse sujeito “incumprindo deveres funcionais, não providenciou no sentido de que a sociedade efectuasse o pagamento da coima em que estava defini- tivamente condenada e deixou criar uma situação em que o património desta se tornou insuficiente para assegurar a cobrança coerciva” (Acórdão n.º 150/09). Daí que esteja assegurada a conexão da sanção com a prática de actos ou omissões por aqueles que a sofrem, mesmo que se admita, na esteira do que acima defendemos, uma comunhão de natureza das duas responsabili- dades, o que implica atribuir natureza sancionatória também à que recai sobre os administradores. As consequên- cias sancionatórias a que os administradores ficam sujeitos poderiam ter sido por eles evitadas, mediante práticas de gestão não culposas. Ora, quando carregado com o sentido valorativo adveniente do princípio da pessoalidade das penas que o informa, o conceito de transmissão não abrange situações deste tipo. Não dispensando a solução em juízo, como elemento da matriz de imputação da responsabilidade, um pressuposto ligado à conformação, por vontade própria, da actuação do sujeito subsidiariamente responsável, ela satisfaz suficientemente, quanto aos pressupostos da res­ ponsabilidade, o princípio da pessoalidade, não comprometendo os valores que lhe subjazem. 15. Mas, se assim é quanto ao fundamento da responsabilidade, o mesmo não se pode dizer quanto ao seu objecto. De facto, se a culpa imputável ao responsável é condição do nascimento da situação de responsabilidade, ela é inteiramente desconsiderada na determinação da sanção aplicável. Na concretização da medida da coima,

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