TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 80.º Volume \ 2011
115 acórdão n.º 26/11 impossibilidade de efectivação da responsabilidade que recai sobre a pessoa colectiva que leva a recorrer, para ga- rantir a produção de um mesmo resultado patrimonial, à responsabilidade civil, posta a cargo de um outro sujeito, chamado a responder em função da sua actuação sobre o património do devedor da coima. É justamente esta colocação da responsabilidade na dependência da falência do processo executivo do paga- mento da coima (processo onde se constata a insuficiência do património das pessoas colectivas) que distancia o re- gime do artigo 7.º-A do RJIFNA do figurino da responsabilidade civil conexa com a criminal. Não estamos perante duas responsabilidades que correm em paralelo, conexionadas apenas pela identidade do facto responsabilizador e do sujeito responsável. Estamos perante a imputação de responsabilidade a uma certa categoria de sujeitos para su- prir a inoperatividade prática da responsabilidade contra-ordenacional que recaía sobre a pessoa colectiva em falta. 13. Essa ligação genética comprova, em nosso juízo, que, com a imputação de responsabilidade aos administra- dores, não há qualquer desvio dos fins da relação que funda a execução: a relação de crédito emergente da aplicação de multas ou coimas pela prática de uma infracção contra-ordenacional. O que resulta da norma desaplicada, em correspondência com o seu teor literal, é a imposição aos administradores de uma posição de responsabilidade nas relações de crédito nascidas pela prática de uma infracção contra-ordenacional e tendo por objecto as multas ou coimas respectivas, não o surgimento de uma outra relação, dotada de natureza, objecto e fins próprios. com aqueles sujeitos por sujeitos passivos. É a satisfação das finalidades repressivas e preventivas dessas sanções que continua a estar na mira do legislador – “carácter marcadamente sancionatório” atribui Saldanha Sanches à respon- sabilidade tributária subsidiária, prevista no lugar paralelo do artigo 24.º da Lei Geral Tributária (LGT) ( Manual de direito fiscal, 3.ª edição, Coimbra, 2007, p. 270). A responsabilização dos administradores e gerentes funciona ainda na órbita funcional da relação contra-ordenacional, como garantia suplementar de cumprimento dos deveres que, nesta, impendiam sobre a pessoa colectiva, perante a Administração. A alteridade de sujeitos não obsta a este entendimento, dada a relação de representação orgânica que une as pessoas físicas responsabilizadas e a pessoa colectiva vinculada àqueles deveres. Em face desta, os administradores e equiparados não são quaisquer terceiros, mas sujeitos que integram os seus órgãos cimeiros. Como constructum jurídico, a pessoa colectiva, sem deixar de ser um centro de imputação jurídica autónomo, age necessariamente através da actividade dos indivíduos que compõem os seus órgãos. Dada essa relação interna, estes não podem ser vistos simplesmente como um “outro”, como sujeitos alheios à estrutura orgânica e operativa da pessoa colectiva. É da sua conduta, da forma como cumprem as funções de direcção e de execução que lhes cabem, que vai depender a actuação deste ente, designadamente quanto ao cumprimento de deveres perante a Administração Pública. Por isso mesmo, a responsabilização dos administradores pode ser considerada um instrumento auxiliar de consecução dos objectivos repressivos e preventivos associados às multas e coimas. A possibilidade legal de verem o seu património afectado, em caso de não cumprimento, pela pessoa colectiva, dos débitos emergentes dessas san- ções, é uma instigação suplementar para que os administradores actuem, no âmbito da sua função gestionária, de forma a que a pessoa colectiva mantenha uma situação patrimonial solvente, propiciadora da satisfação voluntária dessas obrigações, ou, pelo menos, da sua realização coactiva, por via da execução. E é justamente atendendo à relação muito particular entre a pessoa colectiva e a pessoa física que nela exerce funções de administração que os fins que justificam a coima podem ser ainda alcançados com a imposição do seu pagamento a este último sujeito, apesar de ele não ser o autor da infracção que subjaz a essa sanção. Por isso, a adequação e a necessidade da medida não podem ser postas em causa. 14. Mas, se assim é, se a responsabilidade dos administradores se pode justificar como uma garantia adicional de satisfação dos fins das medidas sancionatórias em causa, mostrando-se funcionalmente adequadas a atingi-los, cumpre indagar se tal não tem como consequência inevitável o admitir-se que estamos perante uma transmissão da responsabilidade contra-ordenacional. A responsabilidade dos administradores é também qualificada, pela norma em causa, como responsabilidade sub sidiária. A designação pode admitir-se, como conotação da forma como se articulam entre si as duas responsabilidades, a que vincula a pessoa colectiva e a que vincula os administradores. O nascimento da segunda está dependente da não
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=