TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010
99 acórdão n.º 399/10 Explicita bem esta afirmação a situação dos factos tributários relativos ao IRS serem autonomizáveis a circunstância da “retenção na fonte” incidir sobre cada facto gerador de rendimento individualmente consi- derado, bem como os aludidos rendimentos terem “origens diversas”. Poderia, assim, o legislador, na linha que se vem defendendo, ter operado, nesta sede, pro rata tempore , isto é proceder à divisão proporcional do ano de harmonia com a ocorrência do respectivo facto tributário, con- forme também é propugnado por Nuno Sá Gomes, ( Manual de Direito Fiscal , Vol. II, 1997, pp. 417 e segs.). Desta forma, e, contrariamente ao sustentado no acórdão que fez vencimento, considero que a interpre- tação dada à Lei n.º 12-A/2010, entrada em vigor a 1 de Julho, no sentido de que as novas taxas agravadas de IRS por ela instituídas são aplicáveis aos factos tributários ocorridos antes do início da sua vigência é inconstitu- cional por violação do princípio da irretroactividade fiscal consagrado no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição. 2. Dissenti, também, do juízo formulado, no que se refere à Lei n.º 11/2010, que aprovou um novo escalão de IRS, para rendimentos superiores a € 150 000. Conforme já se referiu supra , existe uma integra- ção na constituição financeira que leva a que se deva considerar que existe um princípio de anualidade que é igualmente aplicável aos impostos, com maior grau de incidência nos escalões. Corresponde à exigência constitucional da progressividade dos impostos sobre o rendimento (artigo 104.º, n.º 1, da Constituição) e incidem, no actual quadro fiscal, sobre o rendimento anual dos agregados familiares. Na verdade, e, como já foi assinalado, enquanto as taxas podem ser diferentes em diferentes períodos do ano, já que os factos tributários são autonomizáveis, os escalões de imposto são, ao invés, por força da lei referidos a todo o ano. Na lição de Guilherme de Oliveira Martins et al ( Lei de Enquadramento Orçamental Anotada e Comen tada , 2007, Almedina, p. 22), a anualidade dos impostos consubstancia uma regra com consagração finan- ceira formal, não só porque a própria ideia de periodicidade resultava da concepção do orçamento, tal como surgia na Constituição (artigo 108.º, na redacção da revisão de 1982), mas também porque se apontava implicitamente para a anualidade no artigo 93.º, alínea c) , também na redacção da revisão de 1982. De qualquer forma, a regra da anualidade regressou ao texto constitucional, por força da redacção do artigo 106.º, n.º 1, dada pela revisão constitucional de 1997. Assim “desde a restauração desta regra orçamental básica, fica dissipada qualquer dúvida que pudesse subsistir quanto à inconstitucionalidade directa da violação da anualidade orçamental”. Desta forma, o novo escalão de 45% só poderia iniciar a sua vigência no início do ano subsequente ao da sua aprovação, isto é, em 1 de Janeiro de 2011. Por conseguinte, e, contrariamente ao sustentado no acórdão que fez vencimento, considero que a interpretação dada ao artigo 2.º da Lei n.º 11/2010, entrada em vigor a 16 de Junho, com o propósito de criar um escalão adicional de tributação, sujeitando os rendimentos anuais superiores a € 150 000 à taxa de imposto de 45% ser aplicável aos factos tributários ocorridos antes do início do ano subsequente à sua vigência é inconstitucional por violação do princípio da irretroactividade fiscal consagrado no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição. – José Borges Soeiro . DECLARAÇÃO DE VOTO Votei vencido essencialmente pelos motivos enunciados pela Senhora Conselheira Maria Lúcia Amaral nos pontos 1., 2., e 3. da sua Declaração de Voto, para os quais, com a devida vénia, remeto. Tais razões conduzem-me, no entanto, a concluir pela inconstitucionalidade das normas submetidas ao julgamento do Tribunal, sem qualquer limitação. – Carlos Pamplona de Oliveira.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=