TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

96 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL III – Decisão Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide não declarar a inconstitucionalidade da norma do artigo 68.º, n.º 1, do Código do IRS, na redacção que lhe foi dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 11/2010 e, posteriormente, pelo artigo 1.º da Lei n.º 12-A/2010, de 30 de Junho. Lisboa, 27 de Outubro de 2010. – Ana Maria Guerra Martins – Gil Galvão – Catarina Sarmento e Cas­ tro – Carlos Fernandes Cadilha – Maria João Antunes – Joaquim de Sousa Ribeiro – Vítor Gomes – Maria Lúcia Amaral (vencida, nos termos da declaração de voto junta) – José Borges Soeiro (vencido, de harmonia com a declaração de voto, que junto) – Carlos Pamplona de Oliveira (vencido conforme declaração) – João Cura Mariano (vencido pelas razões constantes da declaração que junto) – Rui Manuel Moura Ramos (vencido, parcialmente, pelas razões constantes da declaração de voto junta). DECLARAÇÃO DE VOTO Vencida, pelas razões seguintes: 1.  A argumentação do Acórdão estrutura-se em torno de três premissas iniciais. Em primeiro lugar, sustenta-se que a Constituição, no n.º 3 do artigo 103.º, só proíbe a retroactividade autêntica; em segundo lugar, entende-se que as medidas legislativas em juízo, ao criar mais um escalão de IRS e ao aumentar todas as taxas do imposto, não são autenticamente retroactivas; para além disso, conclui-se ainda que tais medidas não lesam os princípios do Estado de direito, “como seja a protecção da confiança”. A fundamentar a primeira premissa apresenta o acórdão, basicamente, duas razões. A primeira é a dos trabalhos preparatórios da IV Revisão Constitucional, de 1997, que introduziu a actual redacção do n.º 3 do artigo 103.º da CRP. Não entrarei agora na discussão, vasta e impossível de travar neste lugar, sobre os métodos de interpre- tação constitucional. Particularmente, sobre a questão de saber se, e em que medida, pode tal interpretação repousar (a propósito de qualquer questão; mas, sobretudo, a propósito de uma questão como esta, que se prende com a determinação do conteúdo e alcance da proibição da retroactividade fiscal) no argumento dos trabalhos preparatórios, de modo a conferir-lhe a autoridade, que aqui se lhe quis atribuir, de argumento último e definitivo. Limito-me a salientar que os termos em que decorreu a discussão parlamentar estão longe de permitir a conclusão, que o Acórdão considera “cristalina”, segundo a qual o legislador de revisão só terá pretendido proibir a retroactividade própria ou autêntica, não integrando por isso o preceito (o n.º 3 do artigo 103.º) a chamada retroactividade inautêntica ou retrospectividade. Quando muito, o que desses traba­ lhos se retira é a convicção segura de que o mesmo legislador, sabendo que o fenómeno da retroactividade se poderia revestir de gradações diferentes, teve consciência das dificuldades de interpretação que a redacção do novo texto por certo traria. Assim sendo, fica por compreender – ainda na lógica estrita dos cânones clás- sicos de interpretação, que é aquela que o Acórdão adopta – por que motivo não explicitou ele, na letra do n.º 3 do artigo 103.º, que a retroactividade que aí proibia era, apenas, a “própria” ou “autêntica”. Se era esta a sua inequívoca vontade, resultante dos trabalhos preparatórios, o silêncio do texto quanto a ela, não sendo facilmente compreensível, não se oferece também como elemento tranquilizador. 2. Em segundo lugar, e para provar que a proibição constitucional da retroactividade tem apenas o alcancerestrito que se afirma ter, o Acórdão invoca jurisprudência anterior doTribunal (Acórdão n.º 128/09). Entendo, contudo, que se extraiu desta jurisprudência algo bem diverso do que ela quis dizer.

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