TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

71 acórdão n.º 338/10 negativa não tem um significado apenas formal, como direito à não inscrição e à não assunção dos deveres, perante o sindicato, que desta resultam (pagamento de quota, etc.). A liberdade de não integrar o substrato pessoal colectivo da associação sindical engloba também, como dimensão substancial do seu conteúdo, e sob pena de se transformar num invólucro quase vazio, o direito a “não ser directamente abrangido pelo domínio de eficácia de actuação de associações sindicais” em que não se está inscrito (A. ob. cit , p. 173, por reporte a Zöllner), no caso, “o direito de não ser prejudicado pelos resultados negociais em sede de contratação colec­ tiva, a que cheguem as associações sindicais a que não se pertence” (A. ob. cit ., p. 172). De outro modo, como o mencionado Autor germânico acrescenta, seria preferível a inscrição obrigatória, pois então estaria assegurada, ao menos, a possibilidade de participação na formação da vontade colectiva. E convém não esquecer que na área da autonomia privada (seja ela individual ou colectiva), a liberdade negativa, como liberdade de não ficar vinculado por efeitos que não se querem, é expressão mais básica da autodeterminação (constitucionalmente consagrada no artigo 26.º, n.º 1, da CRP), a primeira e mais digna de tutela manifestação da liberdade negocial. Dir-se-á, porventura, que “eficácia externa” idêntica à aqui consagrada pode resultar de uma portaria de extensão, figura cuja legitimidade constitucional não tem sido contestada. Mas, para lá de todas as reservas que, neste plano, ela pode suscitar, há que não perder de vista a relevante diferença específica com o regime aqui em presença. No caso da portaria de extensão, é o órgão estadual competente que, ponderando razões de interesse público, dá vigência alargada ao que foi acordado na convenção. Esta apenas dá conteúdo a um outro instru- mento normativo: a portaria de extensão. É esta, não a convenção colectiva, a fonte de vigência do regime constante daquele acto negocial, fora do seu âmbito subjectivo de eficácia. Não assim quanto ao regime do artigo 206.º do CT aqui em apreciação. É o próprio instrumento de regulamentação colectiva, mesmo quando de natureza convencional, que pode prever que o empregador aplique, em certas condições, o regime de adaptabilidade grupal. Isto é, possibilita-se que, por determinação unilateral do credor do trabalho, seja imposto ao sujeito que o presta um horário de adaptabilidade grupal, sem ou contra a sua vontade, com fundamento numa disposição de convenção colectiva que não o vincula. A associação sindical dispõe, por convenção colectiva, sobre o tempo de trabalho de sujeitos que não lhe con- feriram poderes de representação! É o próprio acto negocial privado, não um instrumento legal que acolha o seu conteúdo, a fonte última de vigência do regime. O Acórdão funda esta possibilidade de extensão a trabalhadores não filiados no princípio da igualdade. “Os trabalhadores que operam no quadro de uma mesma empresa ou de um mesmo sector devem estar sujeitos a um mesmo conjunto de condições de trabalho, a menos que haja uma razão válida para assim não suceder», pode ler-se no aresto. Não se contesta a conveniência da uniformidade das condições laborais, do ponto de vista da racio- nalidade de organização e de funcionamento de uma estrutura produtiva. Mas o princípio da igualdade é desfocadamente invocado, para esse efeito. Na verdade, não está em causa a generalização de um tratamento favorável ou a prevenção de um arbitrariamente desfavorável – no que se realiza a função garantística, deon- tologicamente fundada, do princípio da igualdade –, mas antes a aplicação de um tratamento desfavorável a um grupo de trabalhadores, com dispensa da sua aceitação, com base em que a ele estão sujeitos trabalha- dores que laboram no mesmo sector ou unidade e que voluntariamente, por acordo individual ou colectivo, o aceitaram, o que seria justificado pelo interesse de um terceiro, parceiro contratual de ambos os grupos em confronto. Uma actuação, neste sentido, do princípio da igualdade contraria abertamente o seu étimo fundante, dando-lhe um enfoque utilitarista que manifestamente lhe é estranho. Esquecendo que a posição dos voluntariamente aderentes a este regime de horário não é igual, por isso mesmo, à dos não aderentes, a solução, com este fundamento, corre o risco sério de provocar, ela própria, uma situação de desigualdade. De facto, a anuência dos trabalhadores, individual ou, sobretudo, em conven- ção colectiva, a algo que os prejudica terá sido obtida mediante a concessão de contrapartidas, de que não beneficiarão aqueles a quem a solução é imposta, por um “efeito de arrastamento”.

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