TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

70 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL insustentável (“ou contrato a termo ou desemprego”), consagrar paradoxalmente uma solução que sacrifica uma posição subjectiva, com consagração constitucional, desses trabalhadores. Como escreveu o Conselheiro Mário Torres, no já mencionado voto de vencido: «O que não é constitucionalmente admissível é que o meio de promover o emprego de pessoas com maiores dificuldades no respectivo acesso seja exasperar a sua fragilização, consentindo a contratação a termo sem que ocorram causas objectivas do recurso ao trabalho precário, ligadas à transitoriedade do trabalho a prestar, assim consentindo um tratamento discriminatório face aos restantes trabalhadores». Sobejam, pois, razões para me ter pronunciado pela inconstitucionalidade da alínea b) do n.º 2 do artigo 140.º do CT. 2. Quanto ao artigo 206.º do CT: O Código do Trabalho consagra quatro regimes diferenciados de flexibilização do período normal de trabalho: adaptabilidade individual, adaptabilidade grupal, banco de horas e horário concentrado. Nenhuma dessas soluções está inteiramente imune a dúvidas de constitucionalidade. No caso da adapta­ bilidade grupal (artigo 206.º), as objecções que suscita são suficientemente fortes para justificar, em meu juízo, uma declaração de inconstitucionalidade. Pela determinação genérica do artigo 204.º, o limite diário do período normal de trabalho (8 horas) pode ser aumentado até 4 horas e a duração do trabalho semanal pode atingir 60 horas (em vez das 40 horas correspondentes ao limite máximo do período normal). Quer pela medida potencial desta extensão, quer, desde logo, pela variabilidade a que o horário de trabalho fica sujeito, dependendo, na sua conformação concreta, de decisões unilaterais do empregador, com perda concomitante, pelo trabalhador, das vantagens de um horário fixo, predeterminado, a solução é extremamente gravosa para direitos laborais constitucionalmente consagrados. Como o próprio Acórdão reconhece, ela representa uma restrição do direito ao repouso [artigo 59.º, n.º 1, alínea d), da CRP], dificul- tando ainda, de forma sensível, “a conciliação da actividade profissional com a vida familiar” [artigo 59.º, n.º 1, alínea b) ], sendo, por essa via, “tocados” o direito ao livre desenvolvimento da personalidade (artigo 26.º, n.º 1) e o direito à família (artigo 36.º). No limite, os direitos à integridade física (artigo 25.º, n.º 1) e à saúde (artigo 64.º) podem ser afectados. Pode questionar-se se a prossecução de interesses empresariais (por mais legítimos que estes se afigurem) não atenta aqui, de forma excessiva e intolerável, contra posições subjectivas nucleares de uma condição laboral conforme à Constituição. No mínimo, as condições e o processo de implantação da adaptabilidade grupal deveriam ter sido for- mulados com particulares resguardos, de modo a impossibilitar que um trabalhador pudesse ficar sujeito a ela sem ou contra a sua vontade – já pondo agora de lado as reservas que justificadamente merece a genuinidade de manifestações de vontade do trabalhador, dentro da relação de trabalho. No que se refere aos trabalhadores directamente vinculados por convenção colectiva de trabalho que a pre- veja, ainda se pode dizer que a representação outorgada à associação sindical subscritora satisfaz suficientemente esta exigência – sem esquecer, todavia, que a afectação, e o seu grau, de interesses pessoais e familiares dependem muito de variáveis individuais, dificilmente representáveis e tidas em conta num processo de normalização tipi- ficadora como é inevitavelmente o que conduz a um instrumento de regulamentação colectiva. Mas a questão fundamental que aqui se suscita é a da extensão do regime a trabalhadores não filiados [alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 206.º] e a da sua aplicação que prescinde de qualquer manifestação da autonomia colectiva, operando por extensão da adaptabilidade individual (n.º 2 do mesmo artigo). Quanto à primeira, ela representa “uma nova e grave violação à liberdade sindical negativa”, como cer- teiramente a qualificou Júlio Gomes, “O Código do Trabalho de 2009 e a promoção da desfiliação sindical”, Novos Estudos de Direito do Trabalho , Coimbra, 2010, pp. 161 segs., p. 176. Na verdade, a liberdade sindical

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