TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

69 acórdão n.º 338/10 mas sim a contratação sem termo, em obediência às opções constitucionais» [dando como pressuposto, bem entendido, de que estamos perante uma necessidade certa e permanente, por parte da empresa, de preenchi- mento de um posto de trabalho]. Está naturalmente em aberto, para o legislador constitucional, no desenho do sistema de tutela dos trabalhadores, dar preferência a uma orientação mais pragmaticamente consequencialista. Mas, em face de uma garantia constitucional, não pode o legislador ordinário restringir o seu alcance, com base nos efeitos perversos alegadamente provocados na esfera de interesses dos trabalhadores (ou de certas categorias de tra- balhadores). 1.3. Mesmo quem entenda superáveis as objecções acima formuladas, quanto à legitimidade dos meios utilizados, choca com obstáculos, a meu ver incontornáveis, nos planos da idoneidade e, sobretudo, da neces- sidade da medida. A eficácia de uma política de emprego mede-se pelo seu contributo para a diminuição da taxa global de desemprego. A medida em causa procura dotar os trabalhadores à procura de primeiro emprego e os de- sempregados de longa duração de um factor preferencial de contratação, de modo a compensar a avaliação desfavorável que tipicamente recai sobre a sua candidatura a postos de trabalho. Como se diz no Acórdão a que esta declaração vai anexa: «A norma visa reduzir o risco do empregador na contratação levando-o assim a contratar pessoas que, de outro modo, seriam, em condições normais, preteridas nos processos de recruta- mento de pessoal». Mas esta medida, se é adequada a provocar uma melhor absorção destas categorias de trabalhadores pelo mercado de emprego, fá-lo, tudo o indica, em proporção significativa, não pelo aumento, mas por uma simples deslocação da oferta de trabalho. Os eventuais melhores índices de contratação dos trabalhadores na situação da norma impugnada obter-se-ão, em parte não despicienda, à custa dos que procuram emprego sem estarem inseridos nas categorias previstas na norma. Não é realista pensar que a procura preferencial destes trabalhadores não tem reflexos numa menor procura dos restantes, a não serem tomadas outras me- didas que nada têm a ver com a agora em apreciação. Na verdade, sendo a necessidade de recurso a trabalho alheio real (de outro modo a empresa nunca contrataria, em nenhuma das modalidades) e permanente (de outro modo estaria preenchida a claúsula geral do n.º 1 do artigo 140.º do CT), a impossibilidade de contratar a termo, não fosse a previsão da alínea b) do n.º 4, levaria provavelmente a empresa, em muitos ca- sos, a contratar por tempo indeterminado. Por isso mesmo, por, na ausência da norma, outros trabalhadores serem prioritariamente chamados em vez dos que procuram o primeiro emprego ou estão em desemprego de longa duração é que se pode dizer, como diz o Acórdão, que estas categorias seriam preteridas nos processos de recrutamento de pessoal [itálico meu]. Em Espanha – país de estruturas produtiva e laboral não muito distantes das nossas – o insucesso da medida foi, aliás, expressamente reconhecido em 1997, levando à proibição da contratação a termo nestas situações – cfr. Susana Sousa Machado, Contratos de trabalho a termo , Coimbra, 2009, p. 174, nota 443. Mas o desrespeito pelo princípio da proporcionalidade torna-se particularmente evidente, em função do juízo de necessidade. De facto, não escasseiam medidas alternativas de fomento de emprego, inclusive de medidas específicas incentivadoras da contratação de trabalhadores à procura de primeiro emprego ou em situação de desemprego de longa duração, dotadas de igual ou (provavelmente) de maior eficácia, sem pôr em causa a efectividade, em relação a esses trabalhadores, de uma garantia constitucional básica, que nenhu- ma razão intrínseca justifica não os abranger. Para assegurar o direito ao trabalho, como constitucionalmente lhe incumbe, os órgãos políticos do Estado (e o legislador, em particular) é livre de, sem pôr em causa esse mandato constitucional, fazer opções de acordo com os critérios orientativos que entenda mais ajustados, de acordo com a sua política para o sector. Razões de oportunidade ou conveniência, presas aos limites de disponibilidade financeira, jogam também aqui, justificadamente, o seu papel. Mas o que o legislador não pode é, com o álibi de uma tuteladora discriminação positiva de trabalhadores com acrescidas dificuldades de acesso ao mercado de trabalho, dentro de um quadro de alternativas definido de modo constitucionalmente

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