TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010
47 acórdão n.º 338/10 «A declaração judicial da ilicitude do despedimento, determinando a invalidade desse facto extintivo da relação contratual laboral, implica que juridicamente tudo se deve passar como se essa relação nunca tivesse sido inter- rompida, pelo que a “reintegração” surge como o efeito normal de tal declaração» . A questão está, porém, em saber se não serão possíveis restrições ao direito à reintegração devidamente fundadas. Como explica Tiziano Treu, ao comparar os direitos português e italiano, no Código do Trabalho “a rigidez [da solução reintegrativa] é atenuada pela faculdade de oposição à reintegração do trabalhador que se concede às pequenas empresas e às entidades patronais que tenham despedido pessoal dirigente, desde que provem que a reintegração viria causar efeitos negativos na actividade da empresa” (“Despedimentos em Itália. Regime Jurídico Vigente. Perspectivas de Reforma”, in Código do Trabalho. Alguns Aspectos Cruciais , Cascais, Principia, 2003, p. 36). Deve anotar-se, desde já, que a ideia da “obrigatoriedade plena de reintegração dos trabalhadores ilicita- mente despedidos só existe em Portugal, pois mesmo nos países latinos, como Espanha e França, o emprega- dor pode opor-se à reintegração, e, em Itália, não há direito de reintegração nas pequenas empresas e relati- vamente a dirigentes” [Pedro Martinez, Anotação ao artigo 392.º, in Código do Trabalho , Pedro Martinez et al . (orgs.), cit., p. 871], vigorando pois neste último país um sistema semelhante ao português. É também importante dizer-se que, no quadro traçado pelo actual Código do Trabalho, para a generali- dade das empresas (pequenas, médias e grandes) e para a generalidade dos trabalhadores (todos os que não tenham cargos de direcção ou administração) vale a solução geral da reintegração do trabalhador na empresa. Além disso, a oposição à reintegração só se pode fazer “com fundamento em factos e circunstâncias que tornem o regresso do trabalhador gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa”, terá de ser apreciada pelo tribunal e não é admitida quando o fundamento de oposição à reintegração for culposamente criado pelo empregador. Estamos, portanto, a apreciar um preceito legislativo com rigorosos pressupostos e com um âmbito delimitado a um tipo específico de empresas e a um tipo específico de trabalhadores e que “só é permitido através de uma decisão judicial que considere existirem razões justificativas para substituir a reintegração por uma indemnização de valor reforçado” (Pedro Furtado Martins, “Consequências do despedimento ilícito”, in Código do Trabalho. Alguns Aspectos Cruciais , cit., p. 61), mais concretamente, os valores dentro dos quais a indemnização se estabelece são o dobro dos valores normais. E de resto, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, a solução não vale nos casos em que a ilicitude do despedimento se fundar em motivo político, ideo lógico, étnico ou religioso. O artigo 100.º, n.º 1, alínea a) , do Código do Trabalho define a “microempresa” como uma empresa que empregue menos de 10 trabalhadores. Ora estas empresas têm uma especificidade laboral e socio-económica. Resulta do Acórdão n.º 306/03 (ponto 18), inserido na linha jurisprudencial dos anteriores Acórdãos n. os 64/91 e 581/95, já citados, que as pequenas empresas e, por maioria de razão, as microempresas, têm especificidades que justificam uma diferente forma de abordagem do problema da relação entre a laboração da empresa e a segurança no emprego, que tenha em conta a necessidade de uma mais estreita articulação no trabalho dentro de uma pequena ou microempresa do que numa grande empresa. A questão suscita ainda menos dúvidas a respeito dos cargos de administração e direcção cujas especifi- cidades são consideradas no Código do Trabalho, por exemplo para efeitos de isenção de horário, de duração do descanso semanal obrigatório, de despedimento por inadaptação ou de aviso prévio em caso de denúncia do contrato por parte do trabalhador (veja-se Maria Irene Gomes, “Comissão de Serviço”, in A Reforma do Código do Trabalho , cit., p. 373). No caso da oposição à reintegração justifica-se um regime diferenciado para estes trabalhadores. Na verdade, os cargos de administração ou direcção têm, por definição, maiores implicações ao nível do funcio namento e da laboração da empresa do que os restantes postos de trabalho. Além disso, nestes casos deve ter-se em conta “a relação de confiança entre as partes que subjaz a estes vínculos, por força das funções
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