TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010
43 acórdão n.º 338/10 Além disso, não se compreenderia que a mesma dispensa não valesse por razões de saúde (artigo 64.º da Constituição) ou de integridade física e psíquica (artigo 25.º da Constituição) do trabalhador, visto tratar-se de direitos fundamentais que vinculam, directamente as entidades privadas (artigo 18.º, n.º 1, da Constitui ção) e não podem ser postos em causa por convenção colectiva de trabalho (veja-se Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, cit., p. 749). Note-se, ainda, que o artigo 35.º, n.º 1, alínea q) , do Código do Trabalho, que prevê a “dispensa de prestação de trabalho em regime de adaptabilidade”, não pode ser afastado por instrumento de regulamen- tação colectiva de trabalho [artigo 3.º, n.º 3, alínea a) , do Código]. Tendo tudo isto em vista, deve concluir-se que os artigos 205.º, 206.º, 208.º e 209.º do Código do Trabalho não padecem de qualquer inconstitucionalidade. 9. Instrução facultativa no processo disciplinar O artigo 356.º, n.º 1, do Código do Trabalho estabelece que “cabe ao empregador decidir a realização das diligências probatórias requeridas na resposta à nota de culpa”. Como salienta Pedro Martínez, “Do novo regime resulta, basicamente, que a instrução passa a ser facultativa. Assim sendo, no despedimento com base em justa causa por facto imputável ao trabalhador, o procedimento disciplinar (…) pode ficar circunscrito à nota de culpa e respectiva resposta, sendo facultativa a instrução. Se o empregador não quiser fazer a instrução do processo, com base na nota de culpa e na cor- respondente resposta pode proferir a decisão fundamentada de despedimento” (anotação ao artigo 356.º, in Código do Trabalho , Pedro Martínez et al . (orgs.), cit., p. 803). Anteriormente, nos termos do artigo 414.º, n.º 1, do Código do Trabalho de 2003, o empregador deve- ria proceder “às diligências probatórias requeridas na resposta à nota de culpa”, a menos que as considerasse “patentemente dilatórias ou impertinentes, devendo, nesse caso, alegá-lo fundamentadamente por escrito”. Este mesmo regime continua de resto a valer, nos termos do n.º 2 do artigo 356.º do novo Código, para “a trabalhadora grávida, puérpera ou lactante, ou a trabalhador no gozo de licença parental”. Mas tão-só nestes bem limitados casos. Segundo o Requerente, o artigo 356.º, n.º 1, do Código do Trabalho viola as garantias de defesa que estando constitucionalmente previstas no artigo 32.º da Constituição para o processo penal são igualmente aplicáveis nos processos sancionatórios, qualquer que seja a sua natureza. Apesar de não ser certo que se pos- sam aplicar as garantias do artigo 32.º, sem mais, a todos os restantes processos sancionatórios, a verdade é que a Constituição contém para todos esses processos um preceito específico que é o n.º 10 do artigo 32.º, o qual determina que “nos processos de contra-ordenação, bem como quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa”. Ora Gomes Canotilho e Vital Moreira ( Consti tuição da República Portuguesa Anotada , cit., p. 526) entendem que “o direito de audiência e defesa deve con- siderar-se inerente a todos os processos sancionatórios incluindo os de natureza privada (disciplina laboral, disciplina das organizações colectivas, etc.), como regra inerente à ordem jurídica de um Estado de direito”. Acrescenta, ainda, o Requerente que o novo regime constitui uma violação do direito à segurança no emprego (artigo 53.º da Constituição). E na verdade, deve considerar-se que o direito à segurança no em- prego (artigo 53.º da Constituição) tem, enquanto princípio de protecção do bem jurídico “trabalho”, uma dimensão objectiva procedimental. A obrigatoriedade de um processo para a aplicação de sanções disci- plinares de despedimento é uma garantia instrumental que confere consistência e efectividade ao direito à segurança no emprego. A questão que se coloca é, contudo, a de saber qual a tramitação que tal processo deverá ter, por força dos artigos 32.º, n.º 10, e 53.º, n.º 1, da Constituição. A Constituição exige certamente a audição do trabalhador, o seu direito de resposta à nota de culpa. E, estando em causa a sanção de despedimento com justa causa, exige, também, que a decisão do empregador seja fundamentada, pois só assim se garante que o empregador concluiu ponderadamente a existência de “justa causa” de despedimento e só assim se salvaguarda o direito do trabalhador se defender eficazmente
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=