TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

409 acórdão n.º 502/10 distintos, em relação de concurso real – o de fraude fiscal e o de branqueamento, como iremos ver mais detalhada- mente a seguir – pelo que, tendo a conduta do Recorrente, destinada a dissimular e ocultar a proveniência ilícita do crime de fraude fiscal, ocorrido já depois da Lei n.º 10/2002, é quanto basta para se dar como verificado o crime, pressuposto os demais elementos típicos, não relevando o facto de aquele crime de fraude fiscal ser anterior àquela Lei. Porém, o crime de fraude fiscal estendeu-se, como os demais, até ao ano 2003, como resulta da matéria de facto provada (Vide, nomeadamente, factos provados a partir de 142, em que o recorrente, entre outros factos, cometeu reiteradamente factos integradores de fraude fiscal.” (o itálico é nosso) 14. Conforme se pode verificar, para o STJ, não interessou saber se os “capitais lavados” foram ou não obtidos através da fraude fiscal em data anterior a 11 de Fevereiro de 2002 e, por isso, é que julgou verificado o crime de branqueamen- to de capitais e condenou o arguido em 3 anos de prisão pela sua prática, apesar de em lado nenhum dos factos provados se referir que os factos e actos dos supra transcritos itens 238 (pontos 6 a 9) e 239 (suprimentos posteriores a 11/2/2002) foram praticados com capitais obtidos por fraude fiscal praticada depois de 11 de Fevereiro de 2002. 15. Tenha-se em consideração que para se verificar preenchido ou cometido o crime de branqueamento de capitais, tem que ser “lavado” capital, não sendo suficiente que tenha sido praticado o crime de fraude fiscal (como diversamente o refere o STJ), pois tem que provar-se que o capital “lavado” foi aquele que foi obtido através da fraude fiscal praticado depois da entrada em vigor da lei 10/2002. 16. Para o STJ mesmo que o capital utilizado na prática dos actos dos itens 238 (pontos 6 a 9) e 239 (su- primentos posteriores a 11/2/2002) tivesse sido obtido pelo arguido em data anterior a 11/2/2002, continuaria a verificar-se o crime de branqueamento. 17. Ora, é aqui que reside a questão que se quer ver apreciada pelo Tribunal Constitucional . O que o arguido pretende que o Tribunal Constitucional aprecie e declare ser inconstitucional é precisamente essa interpretação da lei disciplinadora do crime de branqueamento de capitais proveniente da fraude fiscal aplicada nos autos, julgando-se que para se verificar preenchido aquele tipo legal de crime de branqueamento de capital será necessário que os capitais lavados sejam provenientes do crime de fraude fiscal praticado depois de 11 de Fevereiro de 2002. A entender-se de outro modo, estar-se-ia a permitir que o arguido A. seja condenado e cumpra uma pena de prisão de 3 anos por factos praticados anteriormente à data da entrada em vigor da Lei n.º 10/2002, de 11/2 , quando a Constituição da República Portuguesa, no seu art. 29.º/1, prescreve que “ninguém pode ser sentenciado criminal- mente senão em virtude de lei anterior que declare punível a acção ou a omissão, nem sofrer medida de segurança cujos pressupostos não estejam fixados em lei anterior”. 18. Pelo exposto, se não tivesse sido o entendimento do STJ aquele que supra se deixa referido, então, con- siderando que não se encontra provado nos autos nenhum facto que refira que os actos dos itens 238 (pontos 6 a 9) e 239 (suprimentos posteriores a 11/2/2002) foram praticados com capital obtido por fraude fiscal posterior a 11/2/2002, como é que se compreenderia a condenação do arguido em 3 anos de prisão pela prática do crime de branqueamento de capitais? 19. Por outro lado, não concorda nem aceita o Reclamante tal fundamentação do indeferimento do seu re- curso, desde logo, porque, diversamente do referido pelo Tribunal reclamado, tudo o que para é carreado ou trans- posto para as decisões judiciais é porque tem relevância para as mesmas, pois não faz sentido nenhum alegarem-se razões ou fundamentos numa decisão para depois se referir que as mesmas não contam para a decisão substancial . Como é corrente afirmar-se, para o julgador, o que não está nos autos não está no mundo. O que o STJ afirma agora no seu despacho de não admissão do recurso para o Tribunal Constitucional é precisamente o contrário, ou seja, que apesar de estar no acórdão, não está na condenação?! Trata-se de um entendimento verdadeiramente admirável! 20. Portanto, repetimos, há a referir que, efectivamente, o Supremo Tribunal de Justiça condenou o arguido, ora reclamante, por claramente ter interpretado e por ter entendido que para efeito de verificação do crime de bran­ queamento de capitais em causa nos autos não importava verificar, determinar ou saber se os “capitais lavados” tinham ou não sido obtidos pelo arguido através da actividade de fraude fiscal praticada em data anterior á data da entrada em vigor da Lei 10/2002, de 11 de Fevereiro.

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