TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

373 acórdão n.º 496/10 de autoridade, aos deveres de informação administrativa estabelecidos no diploma. Consequentemente, as empresaspúblicas têm de disponibilizar a quem o requeira informação não procedimental nos mesmos termos e apenas com as limitações geralmente aplicáveis a todos os órgãos administrativos ou que exercem poderes administrativos. E neste âmbito subjectivo fica incluído todo o universo das empresas públicas (as empresas municipais e regionais não estão directamente em consideração neste recurso, embora estejam igualmente abrangidas), quer se trate de entes públicos económicos organizados sob forma institucional de direito público (entes públicos empresariais – artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, na redacção do Decreto-Lei n.º 300/2007, de 23 de Agosto), quer de empresas constituídas sob a forma de sociedade comercial [sociedades nas quais o Estado ou outras entidades públicas estaduais possam exercer, isolada ou conjuntamente, de forma directa ou indirecta, uma influência dominante em virtude de alguma das seguintes circunstâncias: a) detenção da maioria do capital ou dos direitos de voto; b) direito de designar ou de destituir a maioria dos membros dos órgãos de administração ou de fiscalização – artigo 3.º do Decre- to-Lei n.º 300/2007]. O que está em discussão no presente recurso, de acordo com a delimitação a que anteriormente se proce- deu, é se esta subordinação das entidades criadas sob forma societária, com capitais exclusivamente públicos ou dominadas por capitais exclusivamente públicos, para gestão e alienação do património imobiliário do Estado, constitui uma restrição desproporcionada de algumas dimensões de dois direitos fundamentais, o direito de propriedade e de iniciativa económica privada (artigos 62.º e 61.º da CRP, respectivamente), e de alguns princípios fundamentais da “constituição económica”, designadamente o princípio da coexistência dos sectores público, privado e cooperativo e social e o princípio da concorrência [artigos 80.º, alínea c ), e artigo 81.º, alínea f ), da CRP, respectivamente]. Deve ter-se presente que a questão, tal como é colocada e discutida no presente recurso, não consiste em saber se a solução normativa em apreço, esse alargamento do direito de acesso por parte dos cidadãos aos arquivos e registos administrativos (ou esta extensão do âmbito subjectivo do dever, para quem considerar que isso já estava consagrado no regime legal anterior) corresponde a algo de necessário, por exigido pelo n.º 2 do artigo 268.º da Constituição. Com efeito, não vem discutido se essa é uma solução normativa cons­ titucionalmente imposta; mas, apenas, se ela é constitucionalmente permitida. 7. Em primeiro lugar, a recorrente acusa a interpretação normativa sob fiscalização de violar algumas das dimensões da liberdade de iniciativa económica privada e do direito de propriedade, tutelados nos arti­ gos 61.º e 62.º da Constituição. Merece, todavia, ser salientado que as recorrentes não afirmam a colisão frontal da norma em causa com esses preceitos constitucionais. Tecem uma argumentação mais subtil. O que afirmamé que ocorre uma incompatibilidade da interpretação normativa sub judicio “com algumas dimensões” desses direitos. E isto porque reconhecem que as pessoas colectivas públicas ou “de mão pública” (nomeadamente aquelas que estão aqui em causa, as sociedades de capitais integralmente públicos) não são detentoras de direitos fundamentais nos mesmos moldes que as pessoas colectivas privadas. Aceitam que, se estas apenas são titulares dos direitos fundamentais compatíveis com a sua natureza (artigo 12.º, n.º 2, da CRP), o âmbito de titularidade de direitos fundamentais das pessoas colectivas públicas ainda será menor. Mas, segundo sustentam, sem que se lhes negue em absoluto a titularidade de alguns direitos fundamentais ou de algumas dimensões dos mesmos, como sucederia com o direito de propriedade e o direito de iniciativa económica, pressupostos no princípio da concorrência e no princípio da coexistência dos sectores público e privado. É, efectivamente, matéria de controvérsia a titularidade de direitos fundamentais por pessoas colectivas públicas (em sentido lato, na medida em que exerçam funções materialmente administrativas e estejam sujeitasa direcção pública, ainda que constituídas sob forma privada e agindo por meios de direito privado). Isto é, na perspectiva que nos interessa que é a da liberdade de conformação do legislador, é posta em dúvida a existência de limites conteudísticos da legislação directamente decorrentes de direitos (subjectivos) funda- mentais de pessoas colectivas públicas.

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