TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

349 acórdão n.º 485/10 Deste modo, apenas se conhecerá da inconstitucionalidade da norma do artigo 156.º, n.º 2, do CE, por ser a única que tem efectivo reflexo no julgamento do caso concreto. Utilidade do recurso 3. Suscita ainda o recorrente, nas suas alegações, a questão prévia da utilidade do recurso, considerando, no essencial, que a decisão recorrida, para além de assentar na recusa de aplicação da norma do n.º 2 do artigo 156.º do CE, por inconstitucionalidade orgânica, se fundamentou também na (in)validade da prova da Taxa de Álcool no Sangue (TAS) imputada ao arguido, por não ter sido este informado do fim a que se destinava a recolha de sangue, estando ele em condições de recusar ou consentir na sua realização, o que implicava violação das normas dos artigos 32.º, n.º 8, da Constituição da República Portuguesa (CRP), e 126.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (CPP), pelo que, mesmo que o Tribunal Constitucional viesse a julgar procedente o recurso, manter-se-ia inalterado, com estoutro fundamento, o decidido. Sucede que, como recorrente também acaba por admitir, a questão nuclear do consentimento do examinandopara a realização do exame de sangue, para o efeito de determinação do grau de alcoolemia, condicionará necessariamente a própria apreciação da questão da validade da correspondente prova, que é aparentemente autónoma, pois que, caso o Tribunal venha a concluir pela não inconstitucionalidade da norma, fixando interpretação no sentido de que esta não permite a recusa, perderá relevância «a exigência de informação prévia do fim a que se destina a recolha de sangue», para efeitos da validação da prova. Nada obsta, por conseguinte, ao prosseguimento do recurso para conhecimento do seu objecto. Mérito do recurso 4. OTribunal Constitucional, na apreciação de questões de inconstitucionalidade orgânica, tem reitera- damente sustentado, em jurisprudência consolidada, que o que releva, para efeitos da sua verificação, não é o facto de o Governo legislar sobre matéria da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República sem estar munido da competente autorização parlamentar, mas a circunstância de o fazer, nessas condições, em termos que importem uma inovatória alteração do regime jurídico anteriormente vigente (cfr., entre outros, Acórdão n.º 114/08, disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) . Considerando, por um lado, que a questão da exigência legal do consentimento do visado para a recolha de sangue, para o efeito de determinação da taxa de álcool no sangue, tem directas repercussões na configu- ração típica do crime de desobediência, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 152.º, n.º 3, do CE, e 348.º, n.º 1, alínea a) , do CP, matéria que integra o âmbito da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República [artigo 165.º, n.º 1, alínea c) , da CRP], e, por outro, que efectiva- mente não houve, no caso, autorização legislativa que legitimasse o Governo a legislar sobre essa matéria, interessa começar por delinear o sentido evolutivo da legislação referente aos procedimentos para fiscalização da condução sob influência do álcool, para determinar se é possível atribuir à indicada norma do artigo 156.º, n.º 2, do CE um efeito de direito inovatório. Sobre essa matéria, na parte que agora mais interessa considerar, o Código da Estrada, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, editado ao abrigo de autorização legislativa (Lei n.º 97/97, de 23 de Agosto), passou a dispor o seguinte: «Artigo 158.º Princípios gerais (…) 3 - Quem recusar submeter-se às provas estabelecidas para a detecção do estado de influenciado pelo álcool ou por substâncias legalmente consideradas como estupefacientes ou psicotrópicas, para as quais não seja necessário o seu consentimento nos termos dos n. os 2 e 3 do artigo 159.º, é punido por desobediência. (…)

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=