TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

33 acórdão n.º 338/10 do Trabalho. Esclarecendo, depois, que “a combinação da autonomia colectiva e da heteronomia pode, natu- ralmente, ser doseada de modo variável de sistema para sistema. Em todo o caso - continua - a radicação da autonomia colectiva (pela sua mesma aderência à realidade social) tende a reduzir a importância quantitativa e o papel inovatório da regulamentação de origem estadual (…)” De facto, o artigo 3.º, n.º 1, estabelece uma presunção de supletividade da lei em relação aos instru- mentos de regulamentação colectiva, mas não transforma todas as normas legais em normas supletivas. Pelo contrário, faz menção expressa à possibilidade de, por interpretação, se concluir que a norma legal tem um carácter imperativo, não podendo, portanto, ser afastada por instrumento de regulamentação colectiva (veja- -se Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho , cit., p. 125). Por fim, relembre-se novamente que há uma série de matérias em que a lei assegura um estatuto mínimo mesmo em face da contratação colectiva. São, nos termos do artigo 3.º, n.º 3, do Código do Trabalho, as seguintes matérias relativamente às quais os instrumentos de regulamentação colectiva não podem dispor em sentido menos favorável à lei: a) Direitos de personalidade, igualdade e não discriminação; b) Protecção na parentalidade; c) Trabalho de menores; d) Trabalhador com capacidade de trabalho reduzida, com defi- ciência ou doença crónica; e) Trabalhador-estudante; f ) Dever de informação do empregador; g) Limites à duração dos períodos normais de trabalho diário e semanal; h) Duração mínima dos períodos de repouso, incluindo a duração mínima do período anual de férias; i) Duração máxima do trabalho dos trabalhadores nocturnos; j) Forma de cumprimento e garantias da retribuição; l) Capítulo sobre prevenção e reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais e legislação que o regulamenta; m) Transmissão de empresa ou estabelecimento; n) Direitos dos representantes eleitos dos trabalhadores”. Em todas estas matérias de maior importância, nucleares na relação de trabalho, mantém vigência o princípio do tratamento mais favorável. Tendo em conta os termos da parte final dos n. os 1 e 3 do artigo 3.º, o legislador cumpre claramente o mandato constitucional, consubstanciado no disposto no artigo 59.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP), de fixação de um núcleo irredutível em que é manifesta a preocupação da protecção dos interesses dos trabalhadores. Acresce que o espaço (como vimos mais limitado do que poderia à primeira vista parecer) que a lei dá à autonomia colectiva afigura-se amplamente justificado à luz do direito de contratação colectiva (artigo 56.º, n.º 4). Note-se que, terá necessariamente de se partir do princípio de que esse direito é, globalmente, exercido em benefício dos trabalhadores. Relembre-se, a este respeito, que por vezes, “a contratação colectiva pode ser um processo de troca de certas vantagens emergentes da lei, por outras que as entidades representativas dos trabalhadores considerem mais interessantes (Bernardo Xavier, “A jurisprudência Constitucional e o direito do trabalho”, p. 231, in XXV Anos de Jurisprudência Constitucional Portuguesa , Coimbra, Coimbra Editora, 2009, p. 231, nota 62). A lógica de uma rígida prevalência hierárquica da lei em face das convenções colectivas pressupõe uma com- paração norma a norma. Ora, muitas vezes pode suceder que uma norma específica constante de uma CCT seja menos favorável do que a lei, mas o conjunto normativo constante da mesma, através de um jogo de compensações, já não o seja. Tendo tudo isto em consideração, deverá concluir-se que o n.º 1, e em consequência os n. os 2 a 5, do artigo 3.º do Código do Trabalho, não padecem de qualquer inconstitucionalidade. 6. Admissibilidade de contrato de trabalho a termo resolutivo O Código do Trabalho admite, segundo o Requerente, no n.º 4 do artigo 140.º, duas situações de contratação a termo de gritante inconstitucionalidade. Diz, na verdade, a lei que pode ser celebrado contrato a termo para: a) “Lançamento de nova actividade de duração incerta, bem como início de laboração de em- presa ou de estabelecimento pertencente a empresa com menos de 750 trabalhadores”; e b) “Contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego, em situação de desemprego de longa duração ou noutra prevista em legislação especial de política de emprego”.

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