TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010
319 acórdão n.º 481/10 os administradorese equiparados não são quaisquer terceiros, mas sujeitos que integram os seus órgãos cimeiros. Como constructum jurídico, a pessoa colectiva, sem deixar de ser um centro de imputação jurídica autónomo, age necessariamente através da actividade dos indivíduos que compõem os seus órgãos. Dada essa relação interna, estes não podem ser vistos simplesmente como um “outro”, como sujeitos alheios à estrutura orgânica e operativa da pessoa colectiva. É da sua conduta, da forma como cumprem as funções de direcção e de execução que lhes cabem, que vai depender a actuação deste ente, designadamente quanto ao cumprimento de deveres perante a Administração Pública. Por isso mesmo, a responsabilização dos administradores pode ser considerada um instrumento auxiliar de consecução dos objectivos repressivos e preventivos associados às multas e coimas. A possibilidade legal de verem o seu património afectado, em caso de não cumprimento, pela pessoa colectiva, dos débitos emergen- tes dessas sanções, é uma instigação suplementar para que os administradores actuem, no âmbito da sua fun- ção gestionária, de forma a que a pessoa colectiva mantenha uma situação patrimonial solvente, propiciadora da satisfação voluntária dessas obrigações, ou, pelo menos, da sua realização coactiva, por via da execução. E é justamente atendendo à relação muito particular entre a pessoa colectiva e a pessoa física que nela exerce funções de administração que os fins que justificam a coima podem ser ainda alcançados com a impo sição do seu pagamento a este último sujeito, apesar de ele não ser o autor da infracção que subjaz a essa sanção. Por isso, a adequação e a necessidade da medida não podem ser postas em causa. 14. Mas, se assim é, se a responsabilidade dos administradores se pode justificar como uma garantia adi- cional de satisfação dos fins das medidas sancionatórias em causa, mostrando-se funcionalmente adequadas a atingi-los, cumpre indagar se tal não tem como consequência inevitável o admitir-se que estamos perante uma transmissão da responsabilidade contra-ordenacional. A responsabilidade dos administradores é também qualificada, pela norma em causa, como responsabi- lidade subsidiária. A designação pode admitir-se, como conotação da forma como se articulam entre si as duas responsabilidades, a que vincula a pessoa colectiva e a que vincula os administradores. O nascimento da segunda está dependente da não satisfação do direito do credor no seio da primeira, pelo que esta situação funciona como uma espécie de pressuposto negativo da constituição da responsabilidade que passa a recair (ou a recair também) sobre os administradores, já que estes são chamados a responder na decorrência da constatada impossibilidade de realização coactiva, à custa do património do devedor originário, da obrigação de pagar a multa ou coima. Mas há que atentar nos termos precisos em que se processa essa responsabilidade. Ela não se activa apenas por força daquela vicissitude, ocorrida na esfera jurídica do devedor em falta. De facto, não basta a insuficiência patrimonial do devedor originário para que o devedor subsidiário seja chamado à responsabili- dade, como é timbre de um regime de subsidiariedade autêntica. A isso tem que acrescer, como pressuposto necessário, um facto da autoria do devedor subsidiário e a ele imputável: a causação culposa da situação obstativa da satisfação do crédito emergente da multa ou coima. É esse dado que justifica que os administra- dores, ainda que não vinculados ao dever de pagar a coima, sejam responsabilizados pela não realização do crédito correspondente, em sede da execução movida, a título primário, contra o devedor. Como acentua o Acórdão n.º 129/09 – e independentemente da qualificação da responsabilidade por que opta –, é, pois, absolutamente certo que os administradores e gerentes respondem apenas quando veri- ficado um facto próprio, autónomo em relação à infracção contra-ordenacional, com base “num comporta- mento pessoal”. Ainda que como condição primeira da situação de responsabilidade esteja a impossibilidade de efectivar as consequências sancionatórias dessa infracção, contra a pessoa colectiva que a cometeu, na génese última dessa situação releva, como factor adicional sine qua non , uma conduta própria, determinante daquela impossibilidade. Não há, assim, a automática transposição, sem mais, para a esfera de um sujeito, da responsabilidade ini- cialmente gerada na esfera de um outro, por força de factores exclusivamente atinentes à esfera jurídica deste último. A norma não põe a cargo dos administradores uma responsabilidade por factos alheios à sua esfera
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