TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

262 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 6. Por outro lado, daí resulta também que o legislador apenas pode modelar o modus – não o critério – de valoração desses encargos, admitindo que os mesmos sejam fixados presuntivamente. 7. Contudo, mesmo neste caso, o legislador parlamentar, sublinhe-se, não atribuiu um “cheque em branco” que pudesse ser preenchido em termos de delimitar genericamente as deduções por via presuntiva, antes exigindo que essa fixação apenas pudesse realizar-se quando fosse determinada por uma solução de maior segurança para o fisco ou de maior comodidade para os contribuintes. 8. Para as mais-valias, o legislador não estabeleceu qualquer presunção de custos, nem procedeu à sua estipula- ção forfettaria, mas antes um regime analítico-personalizado de valoração das “despesas necessárias” para a alienação de onde emerge o rendimento sujeito a imposto. 9. Apesar das mais-valias constituírem acréscimos patrimoniais não decorrentes da actividade produtiva, é incontornável que o “ganho obtido” (artigo 10.º, n.º 1, do CIRS) pode decorrer da assumpção de toda uma série de despesas/encargos/custos, sem os quais aquele não existiria ou não assumiria a expressão quantitativa que tais encargos possibilitam. 10. Nessas hipóteses, em que essa expressão quantitativa do “ganho” tenha subjacente a realização de despesas que contribuem necessária e decisivamente para a sua epifania, haverá que as tomar em linha de conta na medida em que só atribuindo-lhes relevância se atingirá a real capacidade contributiva do sujeito, tributando-o, em con- formidade, pelo “ganho” líquido, não podendo deixar de se estabelecer uma relação de mútua interferência causal entre despesas que sejam conditio da existência da mais-valia, ou da sua dimensão quantitativa, e os ganhos que sem elas não existiriam, ao menos no valor que aquelas propiciam. 11. Nessa óptica, os encargos suportados pelo sujeito passivo que se traduzem na valorização do bem corre- spondem à realização de uma despesa que se há-de considerar materialmente necessária à concreta alienação pelo valor estipulado, inerente qua tale à realização da própria mais-valia. 12. Ou seja sob pena de violação do princípio da capacidade contributiva, haverá que relevar a esse título toda a despesa que se assuma como conditio sine qua non – indissociável, portanto – do rendimento concretamente obtido, porque traduzida numa despesa necessária para a existência do próprio rendimento sujeito a imposto na expressão quantitativa que aquela lhe faz acrescer, e não apenas como despesa inerente ao acto de alienação, inde- pendentemente, qua tale, dos custos que determinam a existência da própria mais-valia. 13. O que vale por dizer que a lei não pode relevar apenas as despesas necessárias/inerentes à alienação, aquelas sem as quais não pode existir a própria alienação, deixando de fora aquelas que determinam o valor da Mais-Valia ou a sua própria verificação. 14. O artigo 51.º, alínea b), do Código do IRS, é, pois, inconstitucional por violação do princípio da capaci- dade contributiva. 15. E viola esse princípio quando não admite a dedução dos encargos efectiva e comprovadamente suportados para a obtenção do rendimento quando os mesmos sejam considerados necessários e/ou determinantes da sua expressão quantitativa. 16. O artigo 51.º, alínea b), do Código do IRS, é também organicamente inconstitucional, por violação dos artigos 165.º, n.º 1, alínea 1) , e 103.º, n.º 2, da CRP, na redacção em vigor, na medida em que o Governo, ao legislar sobre a matéria, excedeu o mandato injuntivo que resultava da lei de autorização parlamentar, afastando-se do critério aí estabelecido ao não admitir que as deduções correspondam aos custos ou encargos efectivos e com- prováveis que sejam necessários à obtenção do rendimento, excluindo, os encargos e custos com a valorização dos bens e que se têm como necessários e determinantes do rendimento concretamente obtido». Cumpre apreciar e decidir.

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