TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

249 acórdão n.º 446/10 iniciativa do filho posiciona-se como “um nível básico de tutela do direito a conhecer as origens biológicas” (Rafael Vale e Reis, O direito ao conhecimento das origens genéticas , Coimbra, 2008, p. 234), pelo que o prazo de caducidade para ela fixado merece uma ponderação muito semelhante à adequada para os prazos de ca- ducidade das acções de investigação. Mas, também por isso mesmo, o juízo de inconstitucionalidade que recaiu, nos Acórdãos n. os 609/07 e 279/08, sobre o prazo de caducidade fixado na alínea c) do n.º 1 do artigo 1842.º do Código Civil (na redac­ ção anterior à Lei n.º 14/2009), não é extensível, sem mais, à previsão de prazo constante da alínea a) do mesmo artigo, objecto (na actual redacção) da questão de constitucionalidade levantada nos presentes autos. 10. Para além de a dimensão do direito à identidade pessoal do marido da mãe, afectada com a extinção do direito de impugnar, não ser valorativamente equiparável à que está em causa, numa acção de investiga- ção de paternidade, podem invocar-se razões específicas a ponderar, como justificativas da consagração de um prazo de caducidade para o exercício daquele direito. Elas foram apontadas no Acórdão n.º 589/07, nos seguintes termos: «Sabe-se que as razões que justificam a fixação de um prazo de caducidade para a acção de impugnação de paternidade não são inteiramente coincidentes com as que tinham determinado a perempção da acção de investiga- ção de paternidade, pois que para além das considerações de natureza pragmática que se prendem com a certeza e a segurança jurídica e a eficácia das provas, releva ainda com particular acuidade, naquele primeiro caso, a protecção da família conjugal. É esse interesse que explica que um terceiro (pretenso progenitor) não tenha legitimidade ex novo para afastar a presunção de paternidade do marido da mãe e obter o reconhecimento da sua paternidade, e só possa intervir processualmente através do Ministério Público (mediante requerimento que lhe deverá ser apre- sentado em prazo muito curto) e depois de previamente reconhecida a viabilidade do pedido (artigo 1841.º do Código Civil). O direito de impugnação da paternidade está, assim, apenas, na disponibilidade directa dos mem- bros da família, no sentido de que só o marido, a mãe e o filho é que se encontram autonomamente legitimados a intentar a acção. E não está, por isso, excluído que a situação de discrepância entre a paternidade presumida e a realidade biológica se mantenha sempre que não haja interesse concreto por parte dos interessados na destruição da paternidade presumida.» Nesta situação, releva, como factor de ponderação, a protecção da família constituída, ou, como se destaca no mencionado córdão, «o interesse geral da estabilidade das relações sociais e familiares e ao senti- mento de confiança em que deve basear-se a relação paternal, quando se trate de filhos nascidos na vigência do matrimónio». A relação paterno-filial seria necessariamente posta em crise, se colocada numa situação de permanente precariedade e incerteza, por sujeita a ser abolida por acção, exercitável a todo o tempo, sem qualquer preclusão, do pai presumido. 11. Mas não são apenas interesses gerais ou valores de organização social, em torno da instituição familiar, que podem justificar a consolidação definitiva, na ordem jurídica, a partir de determinado limite temporal, de uma paternidade não correspondente à realidade biológica. Também quanto às posições subjectivas em jogo, na acção de impugnação de paternidade se detecta uma relevante diferença em relação às que se confrontam numa acção de investigação de paternidade. Nesta, o eventual interesse do investigado em não assumir um vínculo de paternidade correspondente à realidade biológica não é merecedor de tutela, pelo menos do ponto de vista do direito à identidade pessoal e à auto- conformação da personalidade, não devendo se reconhecida “uma faculdade de o pai biológico se eximir à responsabilidade jurídica correspondente” (Guilherme de Oliveira, “Caducidade das acções de investigação” in Lex Familiae , Revista Portuguesa de Direito de Família , 2004, pp. 7 segs., p.11).

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