TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010
23 acórdão n.º 338/10 tempo que se vem registando já desde 2002 uma redução do número de trabalhadores por conta própria.» (Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, Livro Branco das Relações Laborais, Lisboa, 2007, p. 21). Assim se evidencia que as sucessivas alterações legislativas têm vindo a fazer perigar o princípio da segurança no emprego, como fica claro pelas estatísticas citadas. Teve já o Tribunal Constitucional a possibilidade de se pronunciar sobre a contratação a termo, nomeadamente no Acórdão n.º 581/95, onde se reconheceu que o “método de enumeração de casos”, que a lei utiliza no domínio dos contratos a termo, se liga “à ideia de excepcionalidade da contratação a termo, ideia que, em boa verdade, constitui um desiderato da garantia constitucional da segurança no emprego”. O Acórdão continua ainda: “Se o contrato a termo fosse admitido como regra, então a entidade empregadora optaria sistematicamente por essa forma, contornando a estabilidade programada no artigo 53.º da Cons tituição. Como afirmam Gomes Canotilho e Vital Moreira, a garantia da segurança no emprego «perderia qualquer significado prático se, por exemplo, a relação de trabalho estivesse sujeita a prazos mais ou menos curtos, pois nesta situação o empregador não precisaria de despedir, bastando-lhe não renovar a relação jurídica no termo do prazo. O trabalho a prazo é por natureza precário, o que é contrário à segurança» (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª, p. 289). A garantia constitucional da segurança no emprego significa, pois, que a relação de trabalho temporalmente indeterminada é a regra e o contrato a termo a excepção. Esta forma contratual há-de ter uma razão de ser objectiva. Também aqui a Constituição nos afasta dos paradigmas da liberdade contratual clássica.»” A realidade tem vindo, no entanto, a confirmar que o recurso à contratação a termo, face à letra da lei, adquiriu o carácter de regime-regra, o que colide com o direito à segurança no emprego que, como bem se salienta no Acórdão n.º 632/08, implica “um direito à possível estabilidade do emprego que se procurou e obteve” e exclui “situações injustificadas de precariedade de emprego”. Assim, a mera possibilidade de lançamento de uma actividade de duração incerta e o início de laboração de empresa com menos de 750 trabalhadores (sendo que a estrutura empresarial da economia portuguesa é domi- nada por empresas com menos de 50 trabalhadores – em 2006, 99,4% do total das empresas e 62,2% do total do emprego), legitima desde logo que a entidade patronal possa contratar a termo, ainda que a esse vínculo corresponda um posto de trabalho permanente. Tomemos, por exemplo, o lançamento de um hipermercado – conhecidos pela elevada precarização dos seus trabalhadores – com menos de 750 trabalhadores: poderá, legalmente, contratar a termo trabalhadores para postos de trabalho permanentes. Já na segunda hipótese aventada pela legislação em vigor está longe de estar assente a interpretação do conceito de 1.º emprego. Assim, para a corrente que entende que 1.º emprego é todo e qualquer emprego que não tenha sido exercido através de contrato sem termo, pode mesmo chegar-se à situação em que um trabalhador com 40 anos ou mais possa estar à procura do 1.º emprego face à sucessiva contratação a termo. Para estes casos, sendo a ratio legis desta norma o período de adaptação do trabalhador, tal solução está já consagrada através da existência de um período experimental. Não se antolha, ainda, qual a razão de ser da contratação a termo de desempregados de longa duração ou de outra prevista em legislação de política de emprego, deixando-se aqui aos governos uma espécie de «cheque em branco» para a determinação de motivos que permitam o uso deste vínculo precário. De facto, as normas impugnadas colidem com o artigo 53.º da Constituição na medida em que estas restrições ao princípio da segurança no emprego não se conformam com as exigências contidas no artigo 18.º dessa mesma Constituição, mormente com o cumprimento do princípio da proporcionalidade, inscrito na parte final do n.º 2 do referido preceito. Desdobrando-se tal princípio em exigências de adequação, necessidade e razoabilidade não se vê, finalmente, que estes motivos sejam restrições adequadas, necessárias ou razoáveis, por tudo quanto se vem de aduzir. Subscreve-se, pois, a declaração de voto do Conselheiro Armindo Ribeiro Mendes, no douto Acórdão n.º 581/95, onde se defende: “Não há razões materiais que justifiquem a solução legal de precarização do vín- culo laboral relativamente a duas categorias de trabalhadores que não têm qualquer especificidade intrínseca: os trabalhadores que entram no mercado de trabalho pela primeira vez («à procura do primeiro emprego») e os
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