TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010
214 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Questão de constitucionalidade 4. A questão com a qual o Tribunal Constitucional é confrontado no caso dos autos é a da conformi- dade com a Constituição do n.º 1 do artigo 70.º da LPTA, na interpretação segundo a qual a acção para reconhecimento de direito ou interesse legítimo deve ser proposta contra a autoridade competente para praticar os actos administrativos decorrentes, ou impostos, pelo reconhecimento do direito ou interesse legí- timo que o autor se arroga, e não contra a pessoa colectiva em que aquela se integra. Entendem os recorrentes que tal norma viola o princípio da responsabilidade do Estado, consagrado no artigo 22.º da Constituição bem como o direito a uma tutela jurisdicional efectiva dos direitos ou interesses legalmente protegidos dos administrados, consagrado no artigo 268.º da Constituição. A interpretação dada ao preceito no acórdão recorrido corresponde à orientação dominante na juris- prudência do Supremo Tribunal Administrativo [vide, acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 9 de Fevereiro de 1989, proc. n.º 025215, in Apêndice ao Diário da República, de 14 de Novembro de 1994, p. 1090; de 23 de Junho de 1998, proc. n.º 38063, in Apêndice ao Diário da República, de 12 de Abril de 2001, p. 923; de 16 de Janeiro de 2001, proc. n.º 45926, in Apêndice ao Diário da República, de 17 de Fevereiro de 2003, p. 71 e de 5 de Julho de 2001, proc. n.º 46056, in Apêndice ao Diário da República, de 16 de Abril de 2003, p. 955]. A posição do STA pode sintetizar-se do seguinte modo: (i) o meio processual a que o legislador resolveu chamar “acção para reconhecimento de direito ou interesse legítimo”, apesar do nome, não tem a estrutura das outras acções, que continuam a reger-se pelas regras do processo civil (artigos 72.º e 73.º da LPTA), mas antes a do recurso contencioso de actos dos órgãos da administração local; (ii) dada a sua estrutura, são-lhe aplicáveis as normas concernentes aos pressupostos do recurso contencioso – com excepção naturalmente daqueles que não se mostram adequados à sua natureza específica, como a existência, ou presunção de ex- istência, de acto administrativo lesivo ou o não esgotamento de um prazo para a interposição ou propositura (que pode ter lugar a todo o tempo, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 69.º da Lei de Processo) – o que significa, no que respeita à legitimidade passiva, que a acção deve ser proposta contra o órgão com com- petência para se pronunciar sobre o direito ou interesse que o autor se arroga e pretende ver reconhecido. Também a doutrina partilhava esse entendimento (vide, José Carlos Vieira de Andrade, A Justiça Ad ministrativa (Lições) , 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 2000, p. 139). Não está em causa, no âmbito do presente recurso, a correcção de tal interpretação da lei processual, designadamente da equiparação da estrutura da acção para reconhecimento de direito à do recurso conten- cioso de anulação. Sob apreciação está apenas a conformidade desse critério normativo com a Constituição. 5. No que respeita à alegada violação do artigo 22.º da Constituição, não se vê de todo em todo como esse preceito constitucional possa ser violado pela norma sub judicio . Desde logo, porque através de uma acção para reconhecimento de direito ou interesse legítimo o autor não pretende ressarcir-se de danos que haja sofrido e pelos quais o Estado e as demais entidades públicas pudessem ser responsáveis. Qualquer que seja a posição adoptada quanto ao alcance e objecto desse meio processual – a doutrina costumava distinguir entre teorias de alcance mínimo, médio e máximo (vide, sobre o assunto, Vieira de Andrade,ob. cit. , pp. 139-147) – é pacífico que fora dele ficam as questões sobre responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas, para o efeito dispondo o particular de meio proces- sual específico, regulado nos artigos 71.º e 72.º da LPTA, tendo nela legitimidade passiva a pessoa colectiva Estado. Assim sendo, não tem sentido a invocação da responsabilidade civil extracontratual do Estado, garantida no artigo 22.º da Constituição.
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