TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

207 acórdão n.º 411/10 Essa salvaguarda, legalmente prevista no próprio artigo 34.º, n.º 3, do CPT, visa justamente limitar o efeito que, de outra maneira, a natureza duradoura da causa interruptiva da prescrição poderia produzir na situação jurídica do contribuinte devedor. Em termos mais precisos, tal salvaguarda impede que o credor tributário possa beneficiar de uma even- tual paralisação do processo que lhe seja imputável. Além disso, mesmo que a paralisação do processo se não fique a dever à conduta processual da Fazenda Pública, mas a quaisquer outras vicissitudes não imputáveis a nenhuma das partes, ainda assim, o devedor não fica desprotegido, pois, passado um ano, reinicia-se a contagem do prazo prescricional. Tal significa que a indefinição da situação jurídica do contribuinte devedor se deve, não ao regime estabelecido para a interrupção da prescrição, mas antes à própria natureza controvertida – a aguardar uma decisão judicial – dessa mesma situação. Com efeito, na pendência da impugnação de actos da Administração Fiscal de liquidação de obrigações tributárias, em que justamente é controvertida a existência ou legalidade da dívida exequenda, inexistem quaisquer expectativas legítimas do contribuinte devedor de se ver liberado da sua obrigação tributária por inércia do exercício do direito por parte do credor tributário. A sua situação jurídica não está ainda definida, porque até ao trânsito em julgado de um litígio em que se discutem questões controvertidas, todas as situações são, por “natureza”, indefinidas, não podendo merecer a tutela da certeza do direito. Eis por que, desde logo, se não vê como é que a norma sub judicio possa ser sequer susceptível de violar o princípio da protecção da confiança e da segurança jurídica. Mas, para além deste argumento, um outro se perfila ainda, que pode bem demonstrar o não fundado da pretensão do recorrente, quando invoca a lesão, in casu, do referido princípio. 5.   Ínsito na ideia de Estado de direito consagrada no artigo 2.º da CRP, o princípio da protecção da confiança obriga a que, na conformação do ordenamento infraconstitucional, o legislador ordinário não deixe de tutelar a certeza e a segurança do Direito. O instituto da prescrição é, justamente, uma das formas pelas quais se concretiza a tutela desses valores. Por seu intermédio, pretende garantir-se que as pessoas saibam com o que podem contar, particularmente naquelas situações em que a um certo dever jurídico se oponha um direito cujo exercício, se mantenha, no tempo, inerte. No entanto, ao regular o instituto da prescrição, o legislador ordinário não está apenas vinculado a proteger a condição jurídica do “devedor” em casos de inércia duradoura do “credor”. Para além disso, o legislador não pode deixar de preservar o núcleo essencial do direito cujo exercício a actuação da prescrição virá a inviabilizar. Tal significa, por exemplo – e como se disse no Acórdão n.º 148/87, disponível em www.tribunalconstitucional.pt – que o prazo de prescrição não pode ser de tal modo exíguo que dele resul­ tem, de forma desproporcionada, manifestas e efectivas limitações do direito que é tutelado. Esta última exigência, para além de poder decorrer do âmbito de protecção normativa de preceitos constitucionais espe­ cíficos em sede de direitos, liberdades e garantias, emerge seguramente, tanto do princípio consagrado no n.º 1 do artigo 20.º da Constituição, quanto do próprio princípio do Estado de direito, consagrado no seu artigo 2.º Assim sendo, melhor se vê como improcede a pretensão da recorrente de extrair imediatamente do princípio constitucional do Estado de direito democrático consequências em matéria do regime da pres­ crição. Sendo certo que desse princípio se retira um mandato dirigido ao legislador de, em nome da certeza e da segurança do Direito, fixar, no domínio pecuniário, prazos prescricionais, não menos certo é que do mesmo princípio se retira igualmente o dever do legislador de assegurar, em medida compatível, o exercício de direitos e interesses legalmente protegidos. Sendo estes os valores constitucionais em conflito, cabe ao legislador ordinário realizar a sua conciliação, através de critérios de concordância prática, com observância das exigências decorrentes do princípio da

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