TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010
165 acórdão n.º 407/10 aplicação, a processos pendentes em tribunal, do regime de exercício das responsabilidades parentais, ainda naquelas situações em que, encontrando-se estabelecida a filiação relativamente a ambos os progenitores, não vivam estes em condições análogas às dos cônjuges? Questão de constitucionalidade 5. A Lei n.º 61/06, de 31 de Outubro, veio alterar o regime jurídico do divórcio. De acordo com a exposição de motivos constante de projecto de lei apresentado à Assembleia da República, três grandes princípios terão inspirado o legislador nesta alteração. Primeiro, o da eliminação da ideia de “divórcio- -sanção”, antes presente no ordenamento jurídico português. Este princípio terá conduzido, no domínio linguístico, ao desaparecimento da expressão legal “divórcio litigioso” e, no domínio valorativo, ao desapare- cimento da culpa como fundamento do divórcio por vontade de apenas um dos cônjuges e sem o consenti- mento do outro. Segundo, o da necessidade de reconhecimento e de valorização dos contributos dados por cada um dos cônjuges para a qualidade “da vida conjugal e familiar, dos cuidados com os filhos e do trabalho dispendido no lar”. Este princípio terá conduzido à inovatória previsão legal de um possível “crédito de com- pensação” para aqueles casos em que, dissolvido o vínculo conjugal, venha a ser manifesta a desigualdade dos referidos contributos. Terceiro, o de «assumir de forma explícita o conceito de responsabilidades parentais como referência central, afastando assim claramente a designação hoje desajustada de “poder paternal” (…)». Ainda de acordo com os motivos expostos no projecto de lei, terá este último princípio levado o legislador a introduzir alterações profundas na disciplina das matérias em causa. Desde logo, alterações terminológicas: o que antes, na constância do matrimónio, se denominava poder paternal (artigo 1901.º do Código Civil, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 496/77, de 25 de Novem- bro), passou a designar-se responsabilidades parentais (artigo 1901.º do Código Civil, na redacção dada pela Lei n.º 61/2008); e ao que antes, em caso de divórcio [e separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento] se chamava exercício do poder paternal (artigo 1906.º) passou a chamar-se, com a Lei n.º 61/2008, exercício das responsabilidades parentais. Em caso de divórcio, e desde que houvesse acordo dos pais, o poder paternal exercia-se em comum por ambos. Se não houvesse acordo, determinaria o tribunal que o referido poder fosse exercido pelo progenitor a quem o filho fosse confiado, assistindo ao outro o poder de vigiar a educação deste último e as suas condições de vida. Diversamente, impõe agora a nova lei que as responsabilidades parentais sejam sempre exercidas conjuntamente quanto às “questões de particular importância para a vida do filho”, cabendo a responsabilidade pelos “actos da vida corrente”, primacialmente, ao progenitor com quem o filho “resida habitualmente”. A aplicação deste regime regra pode ser afastada pelo tribunal que determine, em sentença fundamentada, que as responsabilidades parentais sejam exercidas por um só progenitor. Tal sucederá, no entanto, apenas quando o exercício em co- mum for julgado contrário aos interesses do filho (artigo 1906.º do Código, na redacção dada pela nova lei). Nos termos dos motivos expostos pelo projecto apresentado à Assembleia, a fundamentar este novo regime (e a nova terminologia) está a convicção segura de que assim se servem melhor “os direitos que se querem salvaguardar”, e que são os das próprias crianças. Na verdade, diz o preâmbulo do projecto que “é vital que seja do ponto de vista das crianças e dos seus interesses, e portanto a partir das responsabilidade dos adultos, que se definam as consequências do divórcio”, pelo que deve a lei evidenciar “a separação entre relação conjugal e relação parental, assumindo-se que o fim da primeira não pode ser pretexto para a ruptura da segunda”, já que “o divórcio dos pais não é o divórcio dos filhos, e estes devem ser poupados a litígios que ferem os seus interesses, nomeadamente, se forem impedidos de manter as relações afectivas e as lealdades tanto com as suas mães como com os seus pais.” O novo regime imperativo de exercício conjunto das responsabilidades parentais, assim fundamentado, foi ainda estendido aos casos em que a filiação se encontre estabelecida relativamente a ambos os progenitores, e estes não vivam em condições análogas às dos cônjuges (artigo 1912.º, na redacção dada pela Lei n.º 61/2008). Ainda aqui, portanto, foi de relevo a alteração legislativa introduzida. Onde antes se determinava que o poder
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