TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

163 acórdão n.º 407/10 Ao caso foram antes aplicadas as regras relativas ao “exercício das responsabilidades parentais” decorrentes das disposições conjugadas dos artigos 1912.º, n.º 1, e 1906.º do Código Civil, na redacção dada pela Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro. O Tribunal assim decidiu porque recusou a aplicação, por inconstituciona- lidade, da norma contida no artigo 9.º daquela Lei n.º 61/2008. Fê-lo nos seguintes termos: «(…) A 30 de Novembro de 2008, entrou em vigor a Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, que procedeu, entre outras alterações, à alteração do regime do exercício do poder paternal, procedendo a uma sua redenominação, passando a referência ao “poder paternal” a considerar-se substituída pela designação “responsabilidades parentais” nas epí- grafes da secção II e da sua subsecção IV, do capítulo II, do título III, do livro IV do Código Civil e em todas as disposições da secção II, do capítulo II, do título III, do livro IV do Código Civil. (…) No entanto, mais importante do que esta redenominação, é a alteração introduzida no leque dos poderes‑de- veres dos progenitores não unidos pelo casamento e que não vivem em condições análogas às dos cônjuges, pre- vendo-se na Lei n.º 61/2008, como regime regra, o exercício em comum das responsabilidade parentais por ambos os progenitores relativamente às questões de particular importância, exercício em comum que só é passível de ser afastado por decisão judicial fundamentada (artigos 1906.º, n. os 1 e 2 e 1912.º, n.º 1, ambos do Código Civil). No regime anterior, no caso de progenitores não unidos entre si pelo casamento e que não vivessem em união de facto, ou havia acordo dos progenitores no sentido do exercício em comum por ambos ou, não existindo tal acordo, o exercício do poder paternal competiria ao progenitor que tivesse a guarda do menor, presumindo-se iuris tantum que tal guarda cabia à mãe do menor. Ao progenitor a quem não competia o exercício do poder paternal assistia o poder de vigiar a educação e as condições de vida do filho (artigo 1906.º, n.º 4, do Código Civil, na redacção anterior à introduzida pela Lei n.º 61/2008). Apesar desta verdadeira revolução copernicana, no que tange o regime do exercício das ora denominadas res­ ponsabilidades parentais, ou talvez por isso, o legislador previu no artigo 9.º da Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, que tal regime não se aplica aos processos pendentes em tribunal. (…) A questão que a referida norma transitória coloca é a de saber se é sustentável, do ponto de vista do princípio constitucional da igualdade, que o conteúdo dos poderes-deveres dos progenitores relativamente a seus filhos possa depender duma circunstância tão aleatória como é a propositura de uma acção. A mesma norma suscita também a questão de saber quais os poderes‑deveres dos progenitores que viram a sua situação resolvida antes da entrada em vigor da Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro. Será que continuarão a ter os mesmos poderes-deveres, não lhes sendo aplicável o novo regime e nem podendo tal alteração legislativa, por si só, fundamentar uma alteração da regulação do exercício do poder paternal? (neste sentido que decididamente repu- diamos veja-se, Tomé d’Almeida Ramião, O Divórcio e Questões Conexas, Quid Juris 2009, p. 164); ou, ao invés, em homenagem ao princípio constitucional da igualdade que impõe que situações iguais devam ser igualmente tratadas, bem como considerando as regras gerais sobre aplicação no tempo de normas relativas ao conteúdo de uma relação jurídica, abstraindo dos factos que lhe deram origem (artigo 12.º, n.º 2, 2.ª parte do Código Civil), deve o novo regime aplicar-se aos processos pendentes? (…) A nosso ver, a norma transitória em análise introduz um tratamento discriminatório, desigual e injustificado dos progenitores em função da simples propositura da acção e conduz ao absurdo do conteúdo dos poderes‑deveres dos progenitores poder divergir tão só por causa daquele critério temporal. Pode até suceder que o mesmo progeni- tor tenha poderes‑deveres distintos relativamente a filhos diferentes e de mães diversas, apenas porque os processos nos quais vieram a ser regulados o exercício do poder paternal/responsabilidades parentais foram instaurados em momentos diversos.

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