TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010
153 acórdão n.º 382/10 7. A contribuição especial foi aprovada pelo Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, com o objectivo de tributar a valorização de que beneficiaram os prédios rústicos e terrenos para construção situados nas zonas envolventes à CRIL, CREL, CRIP, CREP e respectivos acessos, bem como à travessia ferroviária do Tejo e outros investimentos. O valor sujeito a contribuição resulta da aplicação da fórmula prevista no referido artigo 2.º, n.º 1, do Regulamento. Por outro lado, os valores que servem de base a essa fórmula resultam de avaliação a cargo de comissão constituída pelo contribuinte ou representante por si nomeado e por dois peritos da administração tributária (cfr. artigos 2.º, n.º 2, e 4.º do mesmo diploma). 8. Tendo sido realizada a referida avaliação, em que teve assento perito indicado pela recorrente, foi este posteriormente notificado da liquidação da contribuição, sem que lhe tivesse sido facultado qualquer mecanismo (posterior) de participação no procedimento que conduziu a tal resultado. Do mesmo modo, não foi a recorrente notificada do projecto de decisão final. Invoca, assim, aquela, a violação do artigo 267.º, n.º 5, da Constituição, na medida em que não terá sido assegurada a sua participação na tomada de decisão final que a ela diz respeito e que resultou na liquidação do encargo tributário. O tribunal recorrido, no entanto, entendeu que a participação dos administrados não passará, em todas as circunstâncias, pela notificação aos mesmos do projecto de decisão final com o convite para se pronuncia- rem sobre o respectivo teor. Poderá assim o legislador prever – como, aliás, efectivamente prevê –, em deter- minados casos, outros meios de participação os quais darão cumprimento à injunção constitucional do artigo 267.º, n.º 5, transposta, no campo tributário, pelo artigo 60.º da LGT. Por outro lado, se uma participação posterior no procedimento for totalmente inócua, isto é, desprovida de capacidade de produzir alterações na decisão final, e já tendo tido o contribuinte oportunidade prévia de intervir no referido procedimento, deve aquela ser negada atento o princípio geral da proibição de actos inúteis. 9. Nos termos do artigo 267.º, n.º 5, da Constituição, “O processamento da actividade administrativa será objecto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito.”. Esta disposição constava do n.º 4 do mesmo preceito na versão do texto fundamental anterior à revisão constitucional de 1997. A relevância atribuída pela Constituição à participação dos administrados na formação das decisões que lhes dizem respeito reflecte a mudança de concepção da Administração Pública que se operou na segunda metade do século XX. De uma Administração de autoridade e impositiva, o paradigma evoluiu para a Ad- ministração de cooperação, sublimando-se o papel interventivo e constitutivo do administrado, que deixa, assim, de ser um mero objecto da actividade administrativa. Sérvulo Correia (“O direito à informação e os direitos de participação dos particulares no procedimento e, em especial, na formação da decisão administrativa”, in Legislação – Cadernos de Ciência de Legislação , 9/10, Janeiro-Junho, 1994, pp. 149 e segs.) destaca a dupla missão da participação dialógica dos administra- dos: uma missão funcional, pela qual se efectiva a intervenção do administrado na prossecução do interesse público, e uma missão garantística, inerente ao princípio da dignidade da pessoa humana, que impõe um procedimento administrativo orientado para a efectiva participação dos cidadãos na formação das decisões que a eles dizem respeito. O papel do administrado não pode, deste modo, ser funcionalizado, impondo-se um modelo de Administração de concertação e aberta por oposição a uma Administração de imposição e fechada (cfr. Jorge Miranda, “O direito de informação dos administrados”, in O Direito , ano 120, III-IV, Julho-Dezembro, 1988, p. 457). Tal missão garantística visa, fundamentalmente, assegurar a «possibilidade de comunicar à Administração as informações e os argumentos que, do ponto de vista do particular, justifi- cam que a decisão venha a conformar-se com os seus interesses.» (Sérvulo Correia, ob. cit. , p. 150). 10. Esta participação dos administrados na formação das decisões que lhes dizem respeito tem sido objecto de diferentes qualificações por parte da doutrina. Enquanto que alguns autores lhe atribuem a natu reza de direito fundamental (por exemplo, Sérvulo Correia, ob. cit. , pp. 156-157; Vasco Pereira da Silva,
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