TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

137 acórdão n.º 370/10 Na verdade, lê-se na sentença recorrida: «Posto isto, está visto que o subscritor não concorda com a decisão de uniformização de jurisprudência. – Que fazer, pergunta-se? O julgador, segundo o art. 8.º 2 C.C., não pode deixar de aplicar uma lei por a achar injusta ou imoral. Também não pode deixar de seguir a jurisprudência uniformizada por com ela não concordar – apenas o po- dendo fazer se adiantar argumento novo, que não tenha sido considerado ou se houver motivos que possam levar à conclusão que uma jurisprudência está ultrapassada (- cf. Ac. S.T.J. de 13/2/2008, no proc. 409/08-5º S. pontos I a IV do sumário, Ac. T. R. Guimarães de 6/3/2008 no proc. 2706/07-2, pontos 2 a 5 do sumário, e Ac. S.T.J. de 17/10/2007 no proc. 2576/06-4.ª S., sendo relatores, respectiva mente, Simas Santos, Espinheira Baltar e Mário Pereira). Independentemente de tudo quanto ficou dito acima, mesmo no tocante a normas constitucionais que não estiveram no cerne da decisão, sendo assim um “argumento novo adiantado”, redirecciona-se agora o problema para os princípios da soberania partilhada (art. 7º 6 C.R.P), do primado do Direito Internacional (art. 8º C.R.P.), maxime, da União Europeia (n os . 3 e 4 do art. 8º), esta entendida enquanto União de Direito, sendo ambas normas uma pura decorrência do princípio da lealdade, que consta do art. 10º C.R.P.» E foi unicamente com fundamento neste “argumento novo” que a sentença recorrida condenou o FGDAM a pagar a A. a pensão de alimentos relativa ao menor C., determinando que fossem efectuados pagamentos dos retroactivos devidos desde o pedido, constando da parte decisória: «O CDSS deverá observar o n.º 5, do art.º 4º Decreto-Lei n.º 164/99, de 13/5, começando os pagamentos no mês seguinte à notificação do Tribunal ainda que sejam devidos os retroactivos desde o pedido (Dezembro de 2009, fls. 95 do p.p.), decidindo-se assim não seguir a uniformização da jurisprudência por se entender que o de- cidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 12/2009 não estará em conformidade com a Constituição da República Portuguesa, nos termos acima expostos.» Apesar do subscritor da sentença recorrida perfilhar uma interpretação contrária ao critério normativo recusado, como entendeu que apenas podia deixar de o seguir com fundamento num “argumento novo”, encontrou esse argumento na inconstitucionalidade desse critério e com esse fundamento recusou a sua aplicação. Ao Tribunal Constitucional não cabe ajuizar da correcção infra-constitucional deste raciocínio, tendo que o aceitar como um dado adquirido; o que é certo é que a sentença recorrida recusou a aplicação do cri- tério normativo enunciado pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 12/2009, apenas com o “argumento novo” da sua inconstitucionalidade, por violação dos princípios da soberania partilhada (artigo 7.º, n.º 6, da Constituição), e do primado do direito internacional (artigo 8.º da Constituição). A recusa de uma das interpretações possíveis de um determinado preceito, com fundamento na sua inconstitucionalidade, consubstancia uma efectiva recusa de aplicação de norma para efeitos de definição da competência do Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alínea a) , da LTC, pelo que entendi que deveria conhecer-se do mérito do recurso interposto. O tribunal a quo afastou a aplicação da norma constante do n.º 5 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de Maio, na interpretação segundo a qual a obrigação de prestação de alimentos a menor, assegurada pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, só nasce com a decisão que julgue o incidente de incumprimento do devedor originário e a respectiva exigibilidade só ocorre no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal, não abrangendo quaisquer prestações anteriores, com fundamento na sua inconstitucionalidade. É esta recusa que constitui o objecto do recurso interposto pelo Ministério Público.

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