TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

131 acórdão n.º 353/10 Esta intenção geral repercutiu-se no conjunto de alterações introduzidas em sede de recursos. Sem es- quecer que o direito ao recurso constitui uma garantia de defesa, o legislador terá aqui procurado – ainda de acordo com as palavras da proposta de lei – subordinar o exercício de tal direito “a um desígnio de celeridade associada à presunção de inocência e à descoberta da verdade material”. Assim, a nova redacção dada ao artigo 400.º do CPP ( “Decisões que não admitem recurso”), toda ela inspirada pela intenção de “restringir o recurso de segundo grau perante o Supremo Tribunal de Justiça aos casos de maior merecimento penal [substituindo-se], no artigo 400.º, a previsão de limites máximos superiores a 5 e a 8 anos de prisão por uma referência a penas concretas com essa medida”. É neste contexto que merece ser compreendida a actual redacção da alínea e) do n.º 1 do referido artigo 400.º do Código. Antes desta nova redacção, introduzida pela reforma de 2007, era o seguinte, o teor do preceito: «1 – Não é admissível recurso: (...) e ) De acórdãos proferidos, em recurso, pela relações, em processo crime a que seja aplicável pena de multa ou pena de prisão não superior a cinco anos, mesmo em caso de concurso de infracções, ou em que o Ministério Público tenha usado da faculdade prevista no artigo 16.º, n.º 3. » Após a entrada em vigor da Lei n.º n.º 48/2007, de 29 de Agosto, a redacção é a seguinte: «1 – Não é admissível recurso: (...) e ) De acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que apliquem pena não privativa de liberdade.» 6.   Sustenta o recorrente que a interpretação acolhida pela decisão recorrida, segundo a qual a pena suspensa é uma pena não privativa de liberdade [e como tal, nos termos da actual redacção da alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, irrecorrível para o Supremo Tribunal de Justiça o acórdão da Relação que declare a suspensão da execução da pena de prisão, ainda que seja proferido em recurso de decisão absolutória de 1.ª instância], lesa as garantias de defesa consagradas no n.º 1 do artigo 32.º da CRP. São fundamentalmente dois os argumentos que sustentam a tese da inconstitucionalidade. O primeiro é de ordem conceitual. De acordo com o recorrente, a pena suspensa é ainda e sempre uma pena privativa de liberdade. E isto porque, se dela não decorre uma privação actual [da mesma liberdade], o facto de a suspensão poder ser revogada a todo o tempo (artigo 56.º do Código Penal), determinando a revogação o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença, faz com que haja aqui, sempre, uma privação potencial da liberdade. Por este motivo, diz-se, não é certo que a “pena suspensa” possa ser concebida como se fosse uma verdadeira alternativa à pena de prisão. O segundo argumento é de ordem sistémica. Ainda de acordo com o recorrente não faz sentido, sob o ponto de vista do sistema, que se leia a alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP de modo tal que admita recurso para o Supremo a decisão condenatória, proferida pela relação, que censure toda e qualquer pequena e média criminalidade (que condene, por exemplo, em uma pena de seis meses), e já não seja recorrível a decisão da relação que declare a suspensão de execução de pena, ainda que por cinco anos (artigo 50.º, n.º 1, do Código Penal). O desequilíbrio sistémico estaria aqui: afinal de contas, os condenados em seis meses de prisão teriam sempre direito ao reexame da sua causa em terceiro grau de jurisdição; enquanto o não teriam casos de maior merecimento penal – como os condenados a cinco anos, mas com declaração de suspensão de execução da pena. 7.   Deve no entanto dizer-se que não cabe ao Tribunal Constitucional, nem tomar partido sobre con- trovérsias relativas à melhor interpretação do direito ordinário (sem prejuízo da aplicação do princípio da interpretação conforme à Constituição), nem corrigir os, ou pronunciar-se sobre, eventuais “desequilíbrios sistémicos” de que padeça a legislação comum. Ao Tribunal cabe tão-somente, como bem se sabe, emitir juízos de inconstitucionalidade naqueles casos em que o legislador tenha infringido – para usar as palavras

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