TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010

124 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL No n.º 1 do artigo 13.º (é esta a base constitucional que importa considerar, uma vez que a solução normativa não recorre a qualquer “categoria suspeita”), o princípio da igualdade apresenta-se ao juiz como “princípio negativo de controlo” ao limite externo de conformação do legislador. Sem que, no entanto, se lhe negue a plasticidade necessária para, em confronto com dois (ou mais) grupos de destinatários da norma, avalizar diferenças justificativas de tratamento jurídico diverso, na comparação das concretas situações fácti- cas e jurídicas conotadas com um determinado referencial ( tertium comparationis ). A diferença pode, elimi- nado o arbítrio, justificar o tratamento desigual. O princípio da igualdade pressupõe averiguação e valoração casuísticas da “diferença” de modo a que recebam tratamento semelhante os que se encontrem em situações semelhantes e diferenciado os que se achem em situações legitimadoras da diferenciação. Isto posto, recorde-se que o ponto de partida do Tribunal, para efeito de confronto de qualquer solução normativa neste domínio dos serviços públicos essenciais com as exigências do n.º 1 do artigo 13.º da Cons­ tituição, tem de residir na constatação de que, com carácter de generalidade e universalidade, para todos os fornecimentos e para todas as categorias de utentes, a regra é a da caducidade em prazo especialmente curto. É assim também para os fornecimentos de energia eléctrica, de que beneficia a generalidade dos utentes, quer se situem na posição de consumidores em sentido estrito, quer de utilizadores profissionais. Num sistema assim concebido, o que pode ser sujeito a mais exigente escrutínio, face ao princípio da igualdade como proibição do arbítrio, é o tratamento excepcional de determinada categoria de consumos; não a inclusão de qualquer situação no regime geral vigente na matéria. Dito de outro modo, o primeiro universo de referência é o da regra, não o da excepção. Para as soluções que se afastem da regra é que o legislador tem de apresentar uma especial justificação; não para a delimitação negativa da excepção e, portanto, para a inclusão na regra. Num tal quadro normativo global, só poderá censurar-se o legislador, face ao princípio geral da igualdade, por não incluir uma determinada situação no âmbito do regime excepcional menos favorável do que o re- gime geral (especial), se a identidade ou semelhança dessa situação com aquelas que são incluídas no regime excepcional se apresentarem de total e indiscutível evidência. Ora, não pode considerar-se arbitrária a delimitação do âmbito da excepção que passa pela distinção entre ser o serviço fornecido ao utente em média ou em “alta tensão”. Não pode dizer-se que o legislador ao escolher este critério tenha feito uma opção para a qual não é possível apresentar qualquer fundamentação compatível com os critérios constitucionais ou destituída de coerência com os objectivos prosseguidos e os resultados previsíveis. Com efeito, o fornecimento de energia eléctrica em “média tensão” (tensão entre fases cujo valor eficaz é superior a 1 kV e igual ou inferior a 45 kV) ou em “alta tensão” (tensão entre fases cujo valor eficaz é superior a 45 kV e igual ou inferior a 110 kV) é efectuado a utentes que a vão incorporar no seu processo produtivo (de bens ou serviços). Nesse aspecto – como nos aspectos essenciais do processo de determinação da tarifa e cálculo do preço dos consumos (cfr. Regulamento de Relações Comerciais, Anexo ao Despacho n.º 20 218/2009 da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), in Diário da República , II Série, de 7 de Setembro de 2009 e Regulamento Tarifário do Sector Eléctrico, Anexo ao Despacho n.º 27 599/2009, in Diário da Repúbli­ ca , II Série, de 24 de Dezembro de 2009) – há substancial identidade entre uma e outra categoria de utentes. Mas termina aí a certeza sobre a identidade de situações. De modo geral, é diferente a dimensão das em- presas que recorrem a um e a outro tipo de ligação à rede pública ou de aquisição do serviço ou fornecimento. A ligação de “média tensão” é adequada a utilizações industriais ou comerciais, muito variáveis quanto ao tipo e dimensão e muito diversificadas quanto aos sectores de actividade económica ( v. g. , indústria de componentes automóveis, metalúrgica, moldes, vitrificação, grande hotelaria, centros comerciais, aeropor- tos, hospitais, etc.). A ligação em “alta tensão” é geralmente utilizada por grandes empresas industriais que incorporam intensivamente a energia no seu processo produtivo (indústria siderúrgica, indústria da celulose, indústria de plásticos, indústria de adubos, serviços energéticos, etc.). Na interpretação adoptada pela decisão recorrida, com a norma em causa o legislador optou por só excluirda protecção universalmente conferida aos utentes dos serviços públicos essenciais, relativamente ao fornecimento de energia eléctrica, os utentes com ligação em “alta tensão”. Para essa opção pode encontrar-se

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