TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010
122 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL dela resulta e que considera corresponder, em maior ou menor grau, à consecução dos objectivos visados com a medida adoptada (que, dentro dos quadros constitucionais, ao próprio legislador compete definir). Neste domínio, fora de casos de indefensabilidade manifesta das opções legislativas, a escolha do legislador demo- craticamente legitimado para proceder à escolha das políticas públicas a desenvolver num dado momento histórico e do modo de prossegui-las deve prevalecer sobre as avaliações ou as prognoses do órgão de controlo jurisdicional. Na verdade, fora de situações em que o Tribunal seja chamado a efectuar uma ponderação que permita sopesar outros interesses ou posições jurídicas afectadas pela medida – e o desproporcionado será, então, o sacrifício ou restrição desses outros direitos ou situações –, a censura das medidas legislativas por “excesso de protecção” sobrepõe-se ou pressupõe e, na prática, redunda num juízo crítico acerca da escolha das finalidades visadas pelo legislador ou na apreciação do acerto das opções tomadas. O âmbito da prognose legislativa não é, em princípio, controlável pela justiça constitucional. É esta uma limitação funcional que a jurisdição não pode transpor, na medida em que é aos órgãos de direcção política (ao legislador) que compete conformar a vida económica e social, movendo-se num plano de incerteza, por vezes geradora de soluções legislativas de efeitos discutíveis, para os quais o remédio está na vontade do corpo eleitoral. Fazer intervir o princípio da proporcionalidade como parâmetro de controlo do excesso de protecção em si mesmo resolver- -se-ia numa apreciação da bondade material das opções do legislador aí onde não há vinculações constitucio- nais susceptíveis de densificação e controlo objectivos. 8. Por outro lado, deslocando a questão para o plano, mais corrente e de mais definido espectro, de pon- deração entre os interesses beneficiados e os interesses atingidos com a medida - em último termo, é à defesa destes interesses que se dirige a intervenção da recorrente -, também a argumentação improcede. Com efeito, não pode dizer-se que a introdução de prazos especialmente curtos de caducidade para a correcção dos erros de facturação imputáveis ao fornecedor (por deficiência dos equipamentos de medição de sua responsabilidade, por erro de leitura, de cálculo ou de processamento), mesmo quando o utente é um consumidor do serviço em “média tensão”, seja uma regulação jurídica que sacrifique desmesuradamente os interesses do fornecedor do serviço. Nada indicia que o estabelecimento de um prazo de caducidade de 6 meses inviabilize ou torne demasiado onerosa a correcção de tais erros que beneficiem essa categoria de utentes. Designadamente não há elementos para concluir que, nesse prazo, seja impossível ou que implique sobrecustos desrazoáveis para o fornecedor do serviço de fornecimento de energia eléctrica, necessariamente uma empresa dotada de elevado nível de organização, a adopção de medidas de gestão ou de mecanismos de controlo interno que permitam detectar e corrigir erros de facturação de tal natureza, eficientemente e em tempo útil. 9. Finalmente, não procede argumentar com a repercussão negativa que o excesso de protecção con- ferida a uma categoria de utentes tem sobre a qualidade ou o preço da prestação do serviço à generalidade dos consumidores. Em primeiro lugar, esse prejuízo é indirecto e hipotético, não havendo uma relação de causalidade entre uma coisa e outra. As consequências da perda do direito de corrigir a facturação e exigir o pagamento por virtude da caducidade incidem directamente sobre o património do prestador do serviço, não sobre os restantes consumidores. Fazer suportar aos demais utentes das ineficiências de equipamento ou organização que geraram a perda de receita não é uma inevitabilidade. O que o regime legal obriga é a melhor organiza- ção por parte da empresa prestadora, adequando o seu funcionamento ao estímulo negativo de num prazo curto (mas não inviabilizador) o preço do fornecimento se tornar irrecuperável se cometer erros, não a que o fornecedor possa externalizar ou repercutir sistematicamente sobre os demais utentes os efeitos desfavoráveis dessa perda. E, seguramente, que o resultado não deve ser esse efeito perverso, nem é essa a intencionalidade do regime de protecção aos utentes. Salvo naquilo que é o risco técnico do negócio segundo padrões de boa organização e economicidade, a regulação deve obstar a que o fornecedor transforme em agravamento de
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