TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 79.º Volume \ 2010
117 acórdão n.º 352/10 12. Esse resultado acarretaria, por outra banda, um significativo sacrifício financeiro do prestador do serviço de energia eléctrica, desproporcionado, injusto e com possíveis consequências na qualidade do serviço e no interesse geral do País. 13. O encargo dos tribunais, recte do Tribunal Constitucional, apenas pode ser outro: não afastar a alta tensão, mas sim adjuntar-lhe a média tensão, acrescentar, por via interpretativa e integrativa ao art.º 10.º, n.º 3, o seg- mento que falta de modo a cobrir a média e a muito alta tensão; em suma, proceder àquilo a que se chama uma decisão aditiva, seguindo a prática que o próprio Tribunal Constitucional (à semelhança dos de outros países) tem várias vezes já adoptado. 14. Assim, o Tribunal Constitucional deve considerar a interpretação dada pelo STJ ao art.º 10.º da Lei n.º 23/96 inconstitucional e invocando os valores e interesses constitucionais conferir à norma uma interpretação que restabeleça o respeito pelo princípio da igualdade e da proporcionalidade em conformidade com o Parecer do Prof. Jorge Miranda. 15. Se assim não se entender sempre se refere que a A. invoca na sua PI e na sua Réplica que o fornecimento de energia eléctrica à tensão de 15 000 volts efectuado às Rés tem as características próprias de um fornecimento de energia eléctrica em alta tensão. 16. Por outro lado, a A. invoca tais características próprias de fornecimento de energia eléctrica em alta tensão como distintas dos fornecimentos em baixa tensão. 17. Atentemos sobretudo aos factos invocados nos art os 30, 33 e 40 da Réplica mas também aos factos descritos sob os artigos 8 a 27 da PI (só parcialmente quesitados pelo Tribunal de ia Instância, cf. quesitos 6.º a 20.º da Base Instrutória de fls.). 18. O STJ desprezou a realidade de facto invocada, decidindo sem a conhecer. 19. Transformou a questão suscitada pressupondo que a média tensão era distinta da alta. 20. Ora, as decisões dos Tribunais não podem pressupor, têm que decidir sobre a realidade de facto apurada aplicando-se o direito. 21. Ora, o que a A. invoca é que o fornecimento em 15.000 volts tem as características próprias da alta tensão. 22. Que conhecimento permite ao Tribunal sustentar o contrário se se coibiu de apurar a realidade de facto? 23. Face aos factos invocados pela A., a interpretação dada pelo Tribunal ao n.º 3 do art.º 10.º da Lei n.º 23/96 é inconstitucional, pois trata o que é igual de forma desigual. 24. Nestas circunstâncias, havendo dúvidas sobre se a média tensão tem as características próprias de um fornecimento de energia eléctrica em alta tensão, deve então o Tribunal Constitucional mandar baixar o processo para que se apurem os factos controvertidos nessa matéria para poder conhecer a questão suscitada, nos termos do art.º 78.º-B da Lei do Tribunal Constitucional. Termos em que deve dar-se provimento ao presente recurso, em conformidade com as conclusões.» A recorrida B. apresentou contra-alegações. Nessa peça processual, excepciona o não conhecimento do recurso, alegando que, em vez de questionar a conformidade constitucional da norma aplicada, o que a recor- rente pretende é a alteração do juízo adoptado pelo Supremo Tribunal de Justiça. E, quanto ao mérito, sus- tenta que a interpretação que foi conferida ao n.º 3 do artigo 10.º da Lei n.º 23/96 não ofende os princípios constitucionais invocados pela recorrente. II – Fundamentação 3. Para tutela dos utentes dos serviços públicos essenciais (serviço de fornecimento de água; serviço de fornecimento de energia eléctrica; serviço de fornecimento de gás; serviço de telefone), a Lei n.º 23/96 regu- lou imperativamente certos aspectos das relações entre aqueles e os fornecedores, proibindo certas práticas, consagrando direitos especiais do utente e impondo particulares deveres ao fornecedor do serviço. Um dos aspectos regulados foi o dos prazos do exercício dos direitos de crédito do fornecedor, seja quanto à cobrança
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