TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010

333 ACÓRDÃO N.º 265/10 Em termos abreviados, esse método consiste na imputação ao agregado familiar de todos os rendimentos líqui­ dos dos seus membros, incluindo a renda financeira implícita calculada nos termos definidos (art.º 10.º da Portaria n.º 1085-A/2004) sobre os activos patrimoniais traduzidos pelos valores dos imóveis, participações sociais e valores mobiliários (considerando-se como tal o rendimento depois da dedução do imposto sobre o rendimento, das con­ tribuições obrigatórias dos empregados para regimes da segurança social e das contribuições dos empregadores para a segurança social) e na subtracção a esse valor da soma do valor da dedução de encargos com necessidades básicas do agregado familiar com o montante da dedução de encargos com a habitação. O valor da dedução de encargos com a satisfação das necessidades básicas do agregado familiar relevante para o efeito é determinado, de acordo com o referido art.º 8.º da Portaria n.º 1085-A/2004, em função do número de elementos do agregado familiar e de um coeficiente pré-determinado, variável em função de diversos escalões de rendimento, também pré-estabelecidos, constantes do anexo da mesma Portaria. Por seu lado, o montante da dedução de encargos com a habitação do agregado familiar é igualmente o resulta­ do da aplicação de um coeficiente pré-estabelecido sobre o valor do rendimento líquido completo, variando aquele coeficiente em função de diversos escalões de rendimento pré-determinados, não podendo, porém, ser superior ao montante da despesa efectivamente suportada (art. 8.º, n. os 3 e 4, e anexo II da mesma Portaria). A concessão ou denegação de protecção jurídica, total ou parcial, encontra-se associada pelo legislador, no anexo I, da Lei n.º 34/2004, à relação proporcional que intercede entre o valor do rendimento relevante para efei­ tos de protecção jurídica, resultante da subtracção ao rendimento líquido das deduções relevantes para o mesmo efeito, acima assinaladas, e o valor do salário mínimo nacional. Ora, se é certo que o método assim construído pelo legislador permite afastar a subjectividade do decisor admi­ nistrativo na ponderação dos elementos económico-financeiros que seriam susceptíveis de evidenciar a capacidade económico-financeira para pagar as custas devidas na acção (sistema de custas esse conformado em função do valor da acção e que deve atender ao nível geral dos rendimentos dos cidadãos, conforme se faz notar no Acórdão n.º 102/98, disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) , também não é menos certo que ele se mostra insensível para atender às especificidades da situação económica de muitos cidadãos requerentes do apoio judiciário. Em certa perspectiva, a concreta inadequação do modelo para responder a essas situações resulta, essencial­ mente, do facto de em caso de baixos rendimentos ou aproximados e de algumas composições do agregado fami­ liar, os coeficientes e os escalões de rendimento fixados, no âmbito das deduções, constantes nos anexos I a IV da Portaria, não serem capazes de deixar disponível para o cidadão uma margem de rendimento com o qual possa satisfazer as custas da acção, mesmo na forma faseada, sem que isso corresponda, perante a emergência de satisfação de necessidades básicas ou essenciais não relevadas ou não relevadas suficientemente pelo legislador, a um impedi­ mento ou dificuldade incomportável, próprios de uma situação de insuficiência económica”. Pelo exposto, porque se entende que a aplicação do critério de apreciação de insuficiência económica pre­ visto no ponto I, 1, alínea c) , do anexo à lei n.º 34/2004, de 29 de Julho e dos critérios matemáticos da Portaria n.º 1085-A/2004, de 31 de Agosto conduzem, no caso concreto, pelo que se expôs, a uma desproporcionada e injustificada restrição do direito fundamental de acesso ao direito, desaplicam-se, por inconstitucionalidade mate­ rial o critério de apreciação de insuficiência económica previsto no ponto I, 1, alínea c) , do anexo à lei n.º 34/2004, de 29 de Julho e os artigos 6.º, 8.º e 9.º e os anexos para que remetem, tudo da Portaria n.º 1085-A/2004, de 31 de Agosto. Considerando um rendimento mensal líquido de € 450,00, tendo em conta as despesas com que o requerente se confronta, despesas essas essenciais ao “viver com dignidade”, e tendo ainda em devida conta as despesas com que o requerente se terá que confrontar num processo judicial, afiguram-se-nos reunidas as condições para que se conclua que o requerente não tem condições económicas para suportar a mencionada taxa de justiça. Em resumo, da análise dos elementos documentais juntos aos autos, resulta que o rendimento do requerente, quando confrontado com as despesas dadas como provadas, não é suficiente para custear os encargos normais de uma causa judicial, sem contender com a satisfação das necessidades básicas do seu agregado familiar.» Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.

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